domingo, 26 de setembro de 2021

Está desfocado o foco da preocupação

 

Está desfocado o foco da preocupação

 

Péricles Capanema

 

A China ameaça a Austrália. Os Estados Unidos, Reino Unido e Austrália, dias atrás, firmaram aliança de cooperação e segurança (AUKUS), que tem como primeiro resultado a encomenda pela Down Under de oito submarinos de propulsão nuclear. A aliança, que provavelmente se estenderá pelas próximas décadas, é parte de gigantesca iniciativa diplomático-militar destinada a conter o imperialismo chinês na região indo-pacífico. Scott Morrison, primeiro-ministro australiano, afirmou que o primeiro dos incialmente encomendados oito submarinos deverá estar pronto em 2040. Mas até lá, a atuação conjunta das três potências e, certamente, ainda o Japão, representará obstáculo sério para a expansão do comunismo chinês na área. Observava eu em artigo recente intitulado “Se eu fosse um australiano”: “Estados Unidos, Inglaterra e Austrália anunciaram ao mesmo tempo a constituição de uma aliança estratégica de segurança e defesa (AUKUS alliance ou AUKUS partnership – em tradução livre, aliança ou parceria da Austrália, Reino Unido e Estados Unidos) com efeitos ao longo dos próximos anos e até décadas à frente, cujo adversário, óbvio, é a China Comunista. Congruentemente, a China reagiu furiosa com o anúncio de tal aliança ▬ “mentalidade anacrônica de guerra fria” e ameaçou os australianos “que se preparem para o pior”, dando a entender, de início, seriam retaliações de ordem comercial”. Outra reação chinesa foi advertir os australianos que eles podem ser alvos de ataque atômico, por estarem construindo submarinos com propulsão nuclear. O Japão manifestou seu contentamento. Em telefonema, Marise Payne, ministra do Exterior da Austrália explicou a Toshimitsu Motegi, ministro do Exterior do Japão, que a AUKUS era um acordo tripartite de segurança entre Estados Unidos, Reino Unido e Austrália, com um olho na China, ao que replicou o colega japonês: “O Japão apoia a criação da AUKUS, iniciativa destinada a fortalecer os compromissos dos três países com a região”.

 

Reage enfurecido o Partido Comunista da Austrália. Como esperado, o Partido Comunista da Austrália emitiu comunicado colérico: “Condenamos incondicionalmente o novo acordo tripartite AUKUS entre Austrália, Reino Unido e Estados Unidos e ainda o anúncio de que a Austrália disporá de submarinos com propulsão nuclear. O acordo custará bilhões e colocará nosso país nas mãos dos Estados Unidos e do Reino Unido. [...] A frota constituirá a primeira iniciativa de uma recentemente formada e altamente perigosa parceria chamada AUKUS. [...] É inequívoca tentativa de deter a China. Não é atitude que favoreça o interesse nacional. Seu objeto é a China e a China não tem dúvidas a respeito ▬ claro passo para deter o desenvolvimento chinês. [...] É um caminho regressivo rumo a uma nova guerra fria em nossa região ▬ ou, cenário pior, de guerra nuclear. Temos o dever de combater esta decisão para o bem de todos”.

 

A Rússia preocupada com o surgimento de nova NATO. Até agora reagiu com cautela o Kremlin diante do surgimento do AUKUS. O comentário oficial do Kremlin foi: “Antes de tomar uma posição, precisamos entender os objetivos, meios. Estas perguntas devem ser respondidas em primeiro lugar. De momento, há pouca informação a respeito.” Logo depois, declarou Nikolai Patrushev, secretário do Conselho de Segurança da Rússia: “O pacto é o protótipo de uma NATO asiática. Washington tentará colocar outros países nesta organização, em especial para levar adiante políticas antichinesas e antirrussas”.

 

Diga-me com quem andas. Arrastado pelo impulso incoercível da lógica, serão para mim espinho na carne, de igual modo para todo católico, as linhas seguintes. O cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado da Santa Sé, declarou-se contra o AUKUS, posição que precipita a diplomacia vaticana, uma vez mais, para a triste condição de companheira de viagem de políticas da China comunista (infelizmente é assim que tem agido habitualmente, anos a fio, a CNBB em relação ao PT). Palavras do cardeal: “A Santa Sé é contra o rearmamento e todos os esforços que têm sido feitos e estão sendo feitos são no sentido da eliminação das armas nucleares, porque elas não são o modo de manter a paz e segurança no mundo. Dentro desta visão, que sempre caracterizou a Santa Sé, fica clara nossa preocupação com o novo acordo entre Estados Unidos, Reino Unido e Austrália”. Está desfocado o foco da preocupação. Deveria ser o imperialismo chinêsO foco da preocupação e

 

Está desfocado o foco da preocupação. Atitudes assim, foco desfocado, impedem avanços reais e provocam retrocessos cruéis. E está claramente fora de foco a preocupação. O foco deveria ser outro: o imperialismo chinês, apocalíptico poder ateu, coletivista, antirreligioso, espantosamente ditatorial. E deveriam causar alívio, despertar esperanças, ações de envergadura, como a constituição de barreira multinacional de grandes potências (o caso da AUKUS) com recursos imensos aptos a defender a prática livre da religião e as liberdades naturais. Mais ainda, importa notar, milhões e milhões de católicos, multidões sem-número, em especial nos Estados Unidos, Reino Unido e Austrália, sentem-se esbofeteados, excluídos das preocupações da Santa Sé, agredidos em seus mais legítimos e nobres interesses, por esta grave tomada de posição do cardeal secretário de Estado. Não ouviu os clamores de seu povo (cfr. Ex 3, 7).

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