Está desfocado o foco
da preocupação
Péricles Capanema
A China ameaça a Austrália. Os Estados Unidos, Reino Unido e Austrália,
dias atrás, firmaram aliança de cooperação e segurança (AUKUS), que tem como
primeiro resultado a encomenda pela Down Under de oito submarinos de propulsão
nuclear. A aliança, que provavelmente se estenderá pelas próximas décadas, é
parte de gigantesca iniciativa diplomático-militar destinada a conter o
imperialismo chinês na região indo-pacífico. Scott Morrison, primeiro-ministro
australiano, afirmou que o primeiro dos incialmente encomendados oito
submarinos deverá estar pronto em 2040. Mas até lá, a atuação conjunta das três
potências e, certamente, ainda o Japão, representará obstáculo sério para a
expansão do comunismo chinês na área. Observava eu em artigo recente intitulado
“Se eu fosse um australiano”: “Estados Unidos, Inglaterra e Austrália
anunciaram ao mesmo tempo a constituição de uma aliança estratégica de
segurança e defesa (AUKUS alliance ou AUKUS partnership – em tradução livre,
aliança ou parceria da Austrália, Reino Unido e Estados Unidos) com efeitos ao
longo dos próximos anos e até décadas à frente, cujo adversário, óbvio, é a
China Comunista. Congruentemente, a China reagiu furiosa com o anúncio de tal
aliança ▬ “mentalidade anacrônica de guerra fria” e ameaçou os australianos
“que se preparem para o pior”, dando a entender, de início, seriam retaliações
de ordem comercial”. Outra reação chinesa foi advertir os australianos que eles
podem ser alvos de ataque atômico, por estarem construindo submarinos com
propulsão nuclear. O Japão manifestou seu contentamento. Em telefonema, Marise
Payne, ministra do Exterior da Austrália explicou a Toshimitsu Motegi, ministro
do Exterior do Japão, que a AUKUS era um acordo tripartite de segurança entre
Estados Unidos, Reino Unido e Austrália, com um olho na China, ao que replicou o
colega japonês: “O Japão apoia a criação da AUKUS, iniciativa destinada a
fortalecer os compromissos dos três países com a região”.
Reage enfurecido o Partido Comunista da
Austrália. Como esperado, o
Partido Comunista da Austrália emitiu comunicado colérico: “Condenamos
incondicionalmente o novo acordo tripartite AUKUS entre Austrália, Reino Unido
e Estados Unidos e ainda o anúncio de que a Austrália disporá de submarinos com
propulsão nuclear. O acordo custará bilhões e colocará nosso país nas mãos dos
Estados Unidos e do Reino Unido. [...] A frota constituirá a primeira
iniciativa de uma recentemente formada e altamente perigosa parceria chamada
AUKUS. [...] É inequívoca tentativa de deter a China. Não é atitude que
favoreça o interesse nacional. Seu objeto é a China e a China não tem dúvidas a
respeito ▬ claro passo para deter o desenvolvimento chinês. [...] É um caminho
regressivo rumo a uma nova guerra fria em nossa região ▬ ou, cenário pior, de
guerra nuclear. Temos o dever de combater esta decisão para o bem de todos”.
A Rússia preocupada com o surgimento de nova
NATO. Até agora reagiu com cautela o Kremlin diante
do surgimento do AUKUS. O comentário oficial do Kremlin foi: “Antes de tomar
uma posição, precisamos entender os objetivos, meios. Estas perguntas devem ser
respondidas em primeiro lugar. De momento, há pouca informação a respeito.”
Logo depois, declarou Nikolai Patrushev, secretário do Conselho de Segurança da
Rússia: “O pacto é o protótipo de uma NATO asiática. Washington tentará colocar
outros países nesta organização, em especial para levar adiante políticas
antichinesas e antirrussas”.
Diga-me com quem andas. Arrastado pelo impulso incoercível da
lógica, serão para mim espinho na carne, de igual modo para todo católico, as
linhas seguintes. O cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado da Santa Sé,
declarou-se contra o AUKUS, posição que precipita a diplomacia vaticana, uma
vez mais, para a triste condição de companheira de viagem de políticas da China
comunista (infelizmente é assim que tem agido habitualmente, anos a fio, a CNBB
em relação ao PT). Palavras do cardeal: “A Santa Sé é contra o rearmamento e
todos os esforços que têm sido feitos e estão sendo feitos são no sentido da
eliminação das armas nucleares, porque elas não são o modo de manter a paz e
segurança no mundo. Dentro desta visão, que sempre caracterizou a Santa Sé,
fica clara nossa preocupação com o novo acordo entre Estados Unidos, Reino
Unido e Austrália”. Está desfocado o foco da preocupação. Deveria ser o
imperialismo chinêsO foco da preocupação e
Está desfocado o foco da preocupação. Atitudes assim, foco desfocado, impedem
avanços reais e provocam retrocessos cruéis. E está claramente fora de foco a
preocupação. O foco deveria ser outro: o imperialismo chinês, apocalíptico
poder ateu, coletivista, antirreligioso, espantosamente ditatorial. E deveriam causar
alívio, despertar esperanças, ações de envergadura, como a constituição de barreira
multinacional de grandes potências (o caso da AUKUS) com recursos imensos aptos
a defender a prática livre da religião e as liberdades naturais. Mais ainda, importa
notar, milhões e milhões de católicos, multidões sem-número, em especial nos
Estados Unidos, Reino Unido e Austrália, sentem-se esbofeteados, excluídos das
preocupações da Santa Sé, agredidos em seus mais legítimos e nobres interesses,
por esta grave tomada de posição do cardeal secretário de Estado. Não ouviu os
clamores de seu povo (cfr. Ex 3, 7).
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