domingo, 28 de dezembro de 2014

Nota elucidativa sobre a absurda desapropriação da fazenda Limeira em Pará de Minas


Nota elucidativa sobre a absurda desapropriação da fazenda Limeira em Pará de Minas


Pleito da justiça e do bom senso, a desistência de desapropriação gravemente lesiva aos sem-terra, ao Erário, ao município de Pará de Minas e a nove herdeiros de antiga família de ruralistas que apenas querem produzir em seu pedaço modesto (em média 2 módulos fiscais). O crime permanente de um confisco que esbofeteou a lei, cruel, desumano, injustificado. Nenhuma indenização. Pretexto falaz: função social da propriedade. Motivo real: intervenção ditatorial do Estado para satisfazer imposições de movimentos revolucionários, comunistas. Efeito: destruição da produção, tensão na região, empobrecimento de modestos produtores rurais. Nem um tostão de indenização de ato tirânico perpetrado em 2004. Estamos diante de esbulho claro, retrocesso legal que se perpetua, expressão do atraso das políticas públicas no Brasil. Pequenos produtores foram excluídos do ofício, cortados de seu meio de vida, lançados injustamente na penúria, e seu torrão familiar foi ocupado por agitadores, incompetentes, meliantes, traficantes de glebas outorgadas pelo Poder Público, escorados em medidas disparadas pelo extremismo no poder. O entorno da propriedade antiga ficou desvalorizado.  Pela teoria dos motivos determinantes, a validade de um ato administrativo (no caso a desapropriação), está ligada os motivos indicados como seu fundamento. E todos os motivos foram falsos; ato administrativo nulo. É mais um exemplo doloroso da política de exclusão, regressiva ao extremo, praticada por ideólogos fanatizados, quando tomam o poder estatal. A ferida infecciona a região, é fator de inquietação, traz insegurança jurídica, inibe investimentos, impede a criação de empregos. Dessa forma, tal desapropriação fere a função social do emprego e da propriedade. Repita-se, o autêntico esbulho ali perpetrado diminui a oferta de emprego e comprime salários na região, bem como inibe a produtividade das propriedades naquela zona. Eliminar tal retrocesso constitui obrigação moral; avivaria o senso de justiça e manifestaria preocupação efetiva com os mais necessitados. Em suma, a devolução da propriedade a seus donos legítimos, medida de progresso e inclusão, traria a pacificação social à região.   

Fazenda: Limeira (em processo de desapropriação), antiga, formada, nas mãos da mesma família de ruralistas há 4 gerações. Localização: Pará de Minas (entrada pela rodovia MG-50). Proprietário: espólio de Newton de Melo Franco. Processo de desapropriação nº 46397-47.2013.4.01.3800. Matrícula R-6.2593, fl. 209, Livro 2-1, Cartório do Registro de Imóveis da Comarca de Pará de Minas. Decreto de desapropriação por interesse social de 21 de maio de 2004. Indeferimento do mandado de segurança no STF em 24.2.2011.
Área total: 364,48 ha (embora no INCRA originariamente conste 405); mesorregião metropolitana (IBGE) de Belo Horizonte; microrregião homogênea (IBGE) de Pará de Minas; distância da sede municipal: 5,7 km; cerca da metade da Limeira já está legalmente incluída na zona de expansão urbana do município. Imóvel no perímetro do decreto federal nº 6.660/2008 que impõe restrições à supressão de remanescentes de Mata Atlântica. Módulos fiscais: 18,22
Avaliação do INCRA (2/9/2011): Terra nua: R$3.083.047,74; Benfeitorias: R$480.527,20. Total: R$3.563.574,94; avaliação do perito Aurélio, de grande nomeada na região, contratado pelo espólio (janeiro de 2014): Terra nua: R$10.702.000,00; Benfeitorias: R$2.234.000,00. Total: R$12.937.200,00
Pela lei o INCRA deve pagar o preço do mercado (o vigente em 2015, se a sentença for prolatada em 2015), de uma propriedade a cerca de 70 km de BH, asfalto até a porta, cerca de 6 km da BR-262. Teve altíssima valorização de 2004 até a presente data. Hoje está em torno de R$15.000.000,00, é o que afirmam corretores da região.
Ocupação: Há uns 6 meses pelo MST. O TRF concedeu posse ao INCRA.

Objetivo: desistência do INCRA da desapropriação por clara, gritante e gravemente lesiva aos sem-terra (de modo especial, às famílias cadastradas), ao município e à família de ruralistas prejudicada.


Motivos1º) A desistência evitaria grave prejuízo às famílias cadastradas no INCRA, na fila para obter um pedaço de terra. Segundo o artigo “Governo retoma desapropriações e pode assentar até 50 mil famílias” de André Barrocal (Carta Mayor, 19.5.2011), publicação no caso insuspeita, com utilização de dados fornecidos pelo INCRA, 7,7 bilhões de reais foram gastos pelo Erário de 2000 a 2011 para assentar 780 mil famílias (custo médio da desapropriação por família assentada, aproximadamente R$10.000,00). Em 2011, o governo destinaria R$530 milhões para desapropriações, com “potencial para atender até 50 mil famílias”. O custo médio de desapropriação por família continuava, como se vê, segundo os mesmos dados fornecidos pelo INCRA, próximo de R$10.000,00. Em 2013, o INCRA, no assunto em questão, a fazenda Limeira, com base na subavaliação de quase dois anos antes, R$3.563.574,94, aceitou pagar R$178.178,15 por assentado (o limite máximo legal para a região é de R$140.000,00, mas portaria ministerial do MDA autorizou ainda em 2013 para o caso o aumento de 27,27 % sobre o topo legal). Na composição de custos, qualquer técnico da área percebe, já ficou extremamente difícil justificar com fundamentos minimamente convincentes, os praticamente 180 mil reais gastos por assentado só na desapropriação. O INCRA ali espera assentar 20 famílias em área líquida de 7 ha para cada uma (excluída a reserva legal, zonas de proteção ambiental e resíduos da Mata Atlântica, constata o processo). Difícil. Três herdeiros têm direitos reconhecidos na lei e, dois deles, que dependem para sua manutenção do trabalho ali, já constantes do decreto expropriatório. Contudo, argumentandi gratia, admitamos vinte. Num extremo, com apenas os recursos da avaliação do INCRA de 2011 (R$3.563.574,94), se aplicada a média brasileira, 350 famílias poderiam em tese ser atendidas. Outra vez argumentandi gratia, admitamos média de R$15.000,00, aumento de 50% em relação a 2011, e não os R$10.000,00 acima referidos; seriam com esse dinheiro atendidas 237 famílias cadastradas e não apenas 20. Agora, para o outro extremo, a obediência estrita ao que manda a lei, o Estado deve pagar o “preço de mercado” na ocasião da desapropriação. Como está acima, a propriedade hoje está avaliada em aproximadamente R$15.000.00,00. Com esse dinheiro se poderiam destinar terras para 1.500 famílias. Aplicando de novo a mesma porcentagem generosa, o custo médio da desapropriação teria aumentado 50% de 2011 para 2015: seriam 1.000 famílias em vez das 20. Pepe Vargas, ex-ministro do MDA, declarou: “Não iremos comprar terras que custem R$30 mil o hectare” (Sul21, 15.5.2012). Obedecida a legislação, preço de mercado, considerada só a terra líquida para o assentado, 7 ha, e ainda sem considerar os direitos dos antigos proprietários a parte considerável dessa terra, o Estado estaria aqui pagando R$107.142,85 o hectare efetivamente utilizado pelo assentado. Os recursos necessários para atender com rapidez quando menos centenas de famílias cadastradas correm risco iminente de serem consumidos em desapropriação injustificável. A conclusão é inescapável: essa desapropriação, se conhecida objetivamente por milhares de famílias cadastradas, será por elas considerada bofetada em suas expectativas e direitos. 2º) Foi visto, a referida desapropriação não tem esteio na política social, mais ainda, prejudica-a; outra, não existe tensão social no local. Fica evidente, igual água do pote, estamos diante de significativo gasto público injustificável que poderá ser facilmente objeto do escrutínio, quiçá da contestação, dos órgãos legais de controle do uso de recursos públicos. Por exemplo, o TCU. 3º) A mais, a desistência da desapropriação pelo INCRA eliminará o trauma dos produtores rurais de Pará de Minas, que, vendo colegas de profissão prejudicados duramente, sentem-se também agredidos. ) Finalmente, a restituição permitirá aos herdeiros do espólio, nove irmãos, dividi-lo por igual em nove partes modestas e fazê-las produzir intensamente com óbvias vantagens para emprego e renda no município. (28.12.2014)
















sábado, 13 de dezembro de 2014

Petrolão, o combustível explosivo da tática cumpanhera


Petrolão, o combustível explosivo da tática cumpanhera

Péricles Capanema

Pela Globo News o senador Aécio Neves pôs os pingos nos ii: “Eu não perdi a eleição para um partido político. Perdi a eleição para uma organização criminosa que se instalou no seio de algumas empresas brasileiras, patrocinada por esse grupo político que aí está.” Na mesma entrevista foi adiante, e a denunciou entranhada no Estado brasileiro. Ficou a milímetros da conclusão lógica, inescapável: quem conscientemente patrocina facínoras por anos é também facínora. Qualquer um percebe, se funcionou por tanto tempo e com tantas vantagens mútuas, houve, conhecimento, beneplácito, estímulo; sem isso, a organização criminosa não embolsava um alfinete. Rui Falcão, presidente do PT, nas entrelinhas chicoteado de chefe de facínoras, de imediato escumou: “Já estamos interpelando o senador mineiro derrotado. Em seguida, processo crime no STF. O PT não leva recado para casa (quis dizer desaforo).” Fernando Pimentel foi conciliador: “ A última vez que me acusaram de ser participante de uma organização criminosa foi no tempo da ditadura militar. Certamente os partidos políticos não são organizações criminosas. O nosso não é. Tenho certeza que o senador Aécio Neves vai se arrepender desse tipo de declaração”. Aécio, outra vez:  “Não retiro absolutamente nada do que disse.

A contundência da declaração ecoa longinquamente a postura solitária de Winston Churchill diante da ameaça nazista nos anos pesados que antecederam a 2ª Guerra Mundial. Na classe política inglesa, simbolizada tristemente pelo primeiro-ministro Chamberlain com a política do appeasement, inexistia a sensação do perigo mortal iminente e sobreviviam esperanças de acordo. As denúncias do estadista inglês preparavam os dias em que foi necessário constituir aliança político-militar de grandes potências para salvar a liberdade no mundo.

Nas últimas semanas, o PT acuado aplicou de novo, e em dose maciça, tática que vem dando certo. Nomeou Joaquim Levy, economista liberal, partidário da disciplina fiscal, para comandar o ministério da Fazenda. Na mesma direção, Kátia Abreu, líder do agronegócio, para a pasta da Agricultura, e Armando Monteiro, líder empresarial, para o ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Antes, já estava no ministério Guilherme Afif Domingues, e Jorge Gerdau na presidência da Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade do Governo Federal, expoentes no Brasil do liberalismo econômico; escolhas que repetem o objetivo de ter José Alencar, ricaço e dirigente empresarial, como vice de Lula em 2002. Vai no mesmo rumo o favorecimento escandaloso ao programa desagregador da família do governo cumpanhero por setores influentes da CNBB e dioceses Brasil afora sob a alegação furada de seu caráter social. São companheiros de viagem, colaboram com o projeto petista. E qual a razão de chamar para colaboradores pessoas de perfil público oposto às metas hegemônicas do PT?

Importante para o PT, só uma: anestesiar, confundir e dissolver as resistências; água fria na fervura da indignação. Sem a utilização desse ardil, o PT se veria diante de um sem fim de derrotas eleitorais. É recurso usual empregado por movimentos que não têm como impor sua vontade à nação por força própria. Napoleão, ao dominar tiranicamente a França, tendo como instrumento principal poderoso e devotado exército, ainda assim julgou útil nomear Talleyrand para seu mais importante ministro; ele, membro destacado das mais antigas famílias da França, que tinham sido escorraçadas de seu poder e influência pela revolução que o Corso encarnava. O brilhante diplomata foi avalista muito bem recompensado de um programa que destruiu seu mundo e sua classe. E que tinha no bojo os germes que um século depois rebentaram na revolução russa de 1917. Os exemplos são sem conta, nem vale a pena prosseguir neles.

Adiante. O brasileiro médio, parece, ainda não viu claro que hoje o PT, pela via do bolivarianismo, vai despenhar o Brasil no coletivismo descarado e no totalitarismo sem disfarce. A perspectiva tétrica da ditadura e miséria generalizada (é só ver as queridinhas do grupo no poleiro, Cuba e Venezuela, modelos invejados de poder popular) assombra no horizonte da longa sucessão de governos cumpanheros, adeptos do gradualismo político. Se visse, resistiria. Mas tem desconfianças. Diante da resistência decidida do povo, mas que arrisca virar pétrea ─ se à inconformidade emocional se somar a oposição doutrinária ampla e bem fundamentada ─, a saída possível é o avanço paulatino e disfarçado. Para isso, o PT tenta desesperadamente manter o poder no Estado e nessa tarefa vem promovendo, junto com dirigentes aproveitadores de partidos aliados, a maior roubalheira que se tem notícia na história do País. Muito da grana roubada no petrolão e escândalos assemelhados, é embolsada pela cumpanherada, mas a maior parte custeia campanhas eleitorais, compra consciências e em geral financia as tentativas de conquista revolucionária das mentalidades, em outras palavras, a hegemonia na sociedade civil, o principal objetivo; enfim, é dinheiro para manter em mãos petistas a máquina do Estado, manhas da conquista e permanência no poder, utilizado sem escrúpulos para implantar um programa final que hoje o brasileiro médio, conhecendo-o, chamá-lo-ia hediondo. Negócio escabroso, o petrolão é combustível explosivo que pode estourar nas mãos de quem o manuseia.

Uma pergunta: por que tem sido bem votado, em suas etapas preparatórias, esse programa de final hediondo? Existe o desconhecimento, já falei, mas influi muito uma realidade importante, pouco enfatizada. Não incluo aqui o voto ideológico. O eleitor de condição modesta, em geral de pouca cultura, desinteressado da política, comumente admite que a cumpanherada rouba, é ruim de serviço, mas tem pena da pobreza; é ou foi gente que nem a gente. Para ele, os políticos dos outros partidos não se preocupam com os pobres. Contra essa impressão enraizada, tantas vezes decisiva na hora do voto, do que adiantam apoios de celebridades, promessas de “quadros qualificados para combater a inflação” e recursos semelhados? Esta multidão não sabe o que é quadro, não usa o adjetivo qualificado e em vez de inflação fala carestia. E então se aprofunda a sensação do alheamento das lideranças políticas das dificuldades diárias da população carente. São problemas vitais para quem quer vencer eleições.


É isso aí.

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Sinais dos tempos

Sinais dos tempos

Péricles Capanema

Frei Betto declarou voto em Dilma. Em linguagem por vezes velada justificou sua posição, alinhando motivos pelos quais muita gente no Brasil será orientada pelo esquerdismo católico a sufragar a atual presidente em 26 de outubro. O ex-frei Boff reforçou o apoio e também dom Demétrio, bispo de Jales que, com petulância, aproveitou para avisar: ─ Dilma, ao chegar aqui, viu o retrato do Papa Francisco e falou: Agora temos um papa que nos apoia.

Vamos às razões apresentadas pelo religioso dominicano: ─ Darei meu voto à Dilma para preservar a política externa do Brasil, soberana e independente, e aprimorar os programas sociais que, nos últimos anos, livraram da miséria 36 milhões de brasileiros(as). Embora o governo do PT tenha defeitos e contradições, não troco o conhecido pelo desconhecido. Quero um governo com política de participação social, comprometido com a agricultura familiar e a preservação da Amazônia. Louvo o Programa Mais Médicos que, graças à ação preventiva, reduz significativamente a mortalidade infantil. E voto em um governo que não criminaliza movimentos sociais, esteios da democracia. ─ É isso.

Agora, desvelar algumas delas.

1º) Preservar a política externa do Brasil, soberana e independente. Está aqui o primeiro e, ao que parece, mais relevante motivo. Na novilíngua companheira política externa soberana quer dizer agir contra os Estados Unidos. Independente quer dizer subserviente aos interesses das ditaduras cubana e venezuelana; fora o resto. Em resumo, o governo Dilma agride interesses vitais dos Estados Unidos e bafeja ditaduras socialistas; isso deixa frei Betto eufórico. Na linguagem rançosa bolchevista, os Estados Unidos são o “inimigo principal”, e vale tudo para prejudicá-lo. Foram exemplo as estarrecedoras declarações da presidente brasileira em Nova York propondo diálogo com terroristas do Estado islâmico, de outro jeito, com o incipiente califado jihadista que decapita turistas, jornalistas e crucifica cristãos, bem como sonha com tirania mundial enquadrada pela aplicação linear da sharia. Um jornalista fez a pergunta: ─ Os Estados Unidos começaram os ataques aéreos na Síria, qual a posição do governo? A presidente emendou de primeira: ─ Eu lamento enormemente isso. O Brasil sempre vai acreditar que a melhor forma é o diálogo. ─ Mas era o mundo civilizado que não queria acreditar no que ouvia. A proposta estava rombudamente clara: começar o diálogo entre a imensa coligação chefiada pelos Estados Unidos e um bando de terroristas corta-cabeças. Nem é necessário comentar. Já em Brasília, a presidente tentou consertar e balbuciou confusos desmentidos ao que tinha proclamado em Nova York. Adiantaram nada, era óbvio o sentido das palavras. O presidente Barack Obama, discursando na ONU, teve resposta perfeita às aterradoras palavras da presidente: ─ A única linguagem compreendida por assassinos como esses é a da força. ─ E assim o Brasil continuaria trotando na trilha em que o frei Betto trabalha para mantê-lo: enfraquecer os Estados Unidos. Na Europa, tal política, ao debilitar o maior adversário, ajuda o expansionismo autoritário do autocrata russo Vladimir Putin.

2º) Aprimorar os programas sociais. No exato, os programas sociais do governo, como estão sendo postos em prática, em numerosos casos perenizam a dependência e a subserviência; de outro modo, no longo prazo, favorecem o empobrecimento e dificultam o crescimento pessoal.

3º) O frei dominicano, corifeu do esquerdismo católico, não podia deixar passar a ocasião de, mais uma vez, apadroar o totalitarismo comunista dos irmãos Castro que rouba a maior parte do salário dos médicos-escravos cubanos no Brasil: ─ Louvo o programa Mais Médicos.

Agora, vamos sair da cerração e respirar ar limpo. Ponho meu foco na boicotada tomada de posição de destacado órgão católico, obediente à doutrina ensinada pela Igreja. Em 23 de agosto próximo passado a Comissão de Defesa da Vida do Regional Sul 1 – CNBB, que agrupa 41 arquidioceses e dioceses, aprovou texto que faz a defesa da vida inocente desde a concepção e enuncia com nitidez a congruente oposição ao aborto voluntário. Fundamenta a posição sobretudo em palavras do papa Francisco e contundentes ensinamentos dos dois papas anteriores, Bento XVI e João Paulo II. E ainda reproduz advertência do bispo de Guarulhos, dom Edmilson Amador: ─ Se um candidato escolheu um partido que tem posições contrárias à defesa da vida, desde a sua concepção até a morte natural, e vincula e obriga a esta posição, seria imoral para o cristão fazer tal opção política.

O documento elenca graves e incontestáveis fatos que provam a contumaz política do governo atual de favorecer a prática do aborto. E deixa evidente que um católico não pode votar pela continuação de um governo que promove o assassinato de inocentes; seria imoral. O texto foi assinado pelos coordenadores da Comissão em Defesa da Vida do Regional Sul-1 da CNBB das arquidioceses e dioceses de Campinas, Guarulhos Itapetininga, Santo André, São José dos Campos e ainda pelo pe. Berardo Graz. Os signatários recordam que exercem o papel profético da denúncia e que calar-se constituiria omissão grave. Autorizaram sua difusão dom Benedito Simão, bispo de Assis, e dom Emílio Pignoli, bispo referencial da Pastoral Familiar.

Em São Paulo, arquidiocese que faz parte da Regional Sul-1, a assessoria de dom Odilo Scherer informou que a comissão é autônoma e que ele não tem vinculação com o documento. Pulou fora, como se vê. Tem mais. O corajoso testemunho não consta de nenhum site oficial da CNBB. Em português claro, a ocultação minuciosa e intolerante do importante pronunciamento pela censura, além de obstáculo iníquo à alardeada participação de leigos, sacerdotes e bispos no legítimo esclarecimento dos fieis, lesiona o próprio direito à informação. E quem não enxerga na inclemente atitude, na prática, escandaloso favorecimento da candidatura petista? Contudo, convém notar, em áreas eclesiásticas, pelo que sei, ainda não apareceu nenhuma crítica doutrinária, nem reparo quanto à oportunidade. O máximo a que esses infelizes êmulos de Goebbels conseguiram chegar (quero crer na minha espessa ingenuidade, ego autem in innocentia mea ingressus sum, que nenhum bispo participou do feroz abafa no interior da CNBB) foi ao silêncio contrafeito. De fato, nem seriam concebíveis repreensões iradas; a peça é a pura expressão do que afirma a moral católica sobre a vida humana e ali só existe sua aplicação lógica a fatos atuais. Seus autores falaram direito em português claro.


Sinais dos tempos em que vivemos: no meio de trevas que podem ser cortadas com faca, aqui e ali fachos de luz pura que nos orientam.

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Exigência inoportuna e hipócrita de mea-culpa

Exigência inoportuna e hipócrita de mea-culpa

Péricles Capanema

A Comissão Nacional da Verdade (CNV), que seria mais bem qualificada de Comissão Nacional da Mistificação, inventou agora outra: quer porque quer um mea-culpa público, institucional, outro jeito, um retumbante pedido de desculpas dos comandantes das três armas por causa da violação dos direitos humanos no período do governo militar, cometidos por colegas seus. Sem o mea-culpa será impossível a reconciliação nacional, um dos objetivos da comissão, alardeiam assanhados. Os outros dois, olha o detalhe, são a verdade e a memória.

Tudo bem, vamos ampliar essa reconciliação. Quanto mais reconciliação, melhor, né? Quem exige, precisa antes dar bom exemplo. Que tal a CNV, amiga, quero crer, da coerência de atitudes, fazer antes um pedido de desculpas, também institucional, ao povo brasileiro por estar desrespeitando escandalosamente a lei 12.528 que a instituiu? E, acertando o passo, passasse logo a obedecê-la na letra e no espírito. Seria também reconciliador, já que a meritória confissão mostraria o desejo de emenda, limitando, entre outras vantagens, a praga já bem disseminada nos últimos anos: a existência de dois tipos de brasileiros, os que estão obrigados a obedecer à lei, nós, você, e os privilegiados, aqui se colocou a turma da CNV, que estão acima dela, e impunemente para ela não dão a menor bola. Não advertiu Lula sobre seu aliado José Sarney, que ele não podia ser tratado como cidadão comum?

Com efeito, a lei que instituiu a CNV, desrespeitada pelos sete que a compõem, fala em investigar as violações de direitos humanos de 1946 a 1988. Neste período houve pavorosas violações de direitos humanos perpetradas contra soldados e oficiais, barbaramente torturados e assassinados pelo terror. A esse respeito, nem uma vírgula. Parece que para ela não tem importância nenhuma que oficiais e praças tenham sido covardemente torturados e assassinados no cumprimento do dever. Azar deles, quem os mandou estar contra os objetivos do terrorismo no Brasil? E a CNV tem ciência que nenhuma organização terrorista defendia a democracia. Queriam impor a ditadura do proletariado e não escondiam, confessavam publicamente nos documentos constitutivos. Hoje, a verdade a respeito também é esbofeteada. Todo mundo sabe que tais movimentos insurrecionais propugnavam a ditadura, mas, parece, todo mundo agora acha bonito mentir a respeito, fashion, politicamente correto, afirmar que defendiam a democracia. Aliás, um ponto útil para restabelecer a verdade e preservar a memória, está dentro dos objetivos legais da CNV. Obediência à lei aqui também.

Tem mais, mermão. A lei que instituiu a CNV afirma que deve ser “composta de forma pluralista”. Ou seja, entende-se, na mente do legislador o pluralismo na escolha dos sete membros faria com que várias correntes estivessem ali representadas. Sem dúvida, pode ser fator de reconciliação que pessoas de diferentes ideologias investiguem e denunciem violações de direitos humanos, não importa quem os tenha perpetrado. O Poder Executivo mandou às favas tal recomendação. Nomeou gente de um só espectro ideológico. Aqui está outro mea-culpa a ser feito, fato recentíssimo, normal que aconteça antes de exigir dos comandantes militares mea-culpa sobre acontecimentos de décadas atrás.

Os privilegiados da CNV (regem-se segundo lei privada, só para eles) exigem o mea-culpa militar, para que acontecimentos censuráveis de décadas atrás, nunca mais se repitam. De minha parte, eu, cidadão comum, quero o mea-culpa da CNV para que a hipocrisia atual não tenha direito de cidadania na vida pública brasileira e continue a alardear impunemente suas falsidades e parcialidades tendenciosas. É a minha mobilização pela verdade e pela memória, para fincar alicerces idôneos à necessária e verdadeira política de reconciliação. Quem não vê que é desumano e hipócrita exigir de oficiais superiores no comando de suas instituições que façam mea-culpa, quando se cala despudoradamente e não se leva na menor conta o sangue derramado por colegas de farda, que tombaram na defesa da pátria, lutando contra organizações que queriam extirpar a democracia de nossas terras?

Não acabou não. A CNV está torrando dinheiro público a mancheias. Este dinheiro em vez de alimentar atividade deletéria de burgueses empanturrados e privilegiados, a esquerda caviar, poderia muito bem estar sendo utilizado para pôr comida na mesa do pobre, tratar doentes e banguelas, que gramam de sol a sol desamparados pelo Brasil afora. Aqui outro mea-culpa prévio: pedir perdão público aos pobres por estar surrupiando dinheiro que normalmente deveria minorar sua sorte e, em vez disso, vem sendo torrado irresponsavelmente em atividades de propaganda ideológica destruidora. Seria ato meritório favorecedor de saudáveis políticas sociais.

Em resumo, tal medida, do jeito que está sendo exigida, vai botar o Exército de joelhos e estadear sua capitulação incondicional. Minha proposta de reconciliação: que antes os membros da CNV e o Executivo façam os mea-culpa que claramente devem à opinião pública, deem bom exemplo, evidenciem sinceridade e então solicitem aos comandantes das três armas um documento sensato, que eles teriam dificuldade de recusar. Ou então, se infelizmente obstinados na hipocrisia, pelo menos tenham a decência de não mais promover a desarmonia na sociedade brasileira. E então, coerentemente, calem a boca, deixem de torrar nossa paciência e de tratar os brasileiros como idiotas.


domingo, 31 de agosto de 2014

A caça ao odiento polarizador nos Estados Unidos


A caça ao odiento polarizador nos Estados Unidos

Péricles Capanema

Vai mar alto o ataque tendencioso à polarização nos Estados Unidos. Não só lá, aliás. Polarização virou palavra-talismã, carregada de radiação; ardilosamente utilizada, bomba atômica para eliminar o adversário, chicoteado como odiento polarizador. Meu foco, as tensões autênticas, vivas rejeições à decadência, tantas vezes no noticiário qualificadas com isenção aparente de polarizadoras. Posições assim, bem administradas, inibem a fragmentação, estimulam restaurações e atiçam os Estados Unidos no rumo direito. Friso o perigo: tem um montão de investidas contra a polarização, cujo resultado é abrir o estradão para políticas girondinas debilitadoras da reatividade; mais ainda, favorecem a disseminação da mentalidade girondina. A análise de A a Z do fenômeno é meio eficaz, à mão, para arrancar a espoleta da bomba e preservar a sanidade da opinião pública. Desço a boa parte dos fatores geradores de tensão. Vou empilhá-los. Arrastando para um polo estão os liberals e assemelhados, aqui se junta o rebanho de mentalidade libertária e esquerdista. Via geral é chegado no inchamento do Estado, tem xodó por medidas protecionistas, simpatiza com o cerceamento da concorrência, a taxação alta e niveladora, embirra com a livre iniciativa, o big business e o corporate world; em sentido contrário, gosta das leis atravancadoras promulgadas para confessadamente proteger o meio ambiente; na linha, zabumba fracassos do mercado e os quer compensados pelo agigantamento estatal na economia. Em outra faixa, costuma apoiar a liberalização do aborto e as práticas homossexuais, e igual, afinado, as políticas de gênero. A mais, de viés ateu, trabalha obstinado pela expansão do secularismo. Um fio liga tais posições: empurram para baixo e fragmentam os Estados Unidos. Puxando para o polo contrário, está o blocão conservador. Defende a vida humana desde a concepção, põe lá em cima a família, as posições for mom and apple pie, segue a work ethics, tem olho feio no bedelho do Estado na vida deles; na economia, gosta da desregulamentação e privatização. Ainda tem coisa: espia com simpatia o mundo das empresas, fica chateado com impostos além da conta, é a favor de orçamento militar robusto e disciplina fiscal; costuma apoiar a atuação dos Estados Unidos no mundo. De resto, distante do ateísmo, vê necessário o recurso a Deus e sua presença na vida pública e privada. Numa só frase, quer de todo jeito os Estados Unidos nação de ponta.

Vou mais fundo: a matéria mais delicada nem é a polarização, é a cristalização (ou a falta dela); vem antes. A cristalização, fenômeno de montante, conforma a polarização, fenômeno de jusante. O que é cristalização aqui? Cristalizar é (re)agir escorado em princípios e não só por hábito; em particular, no caso, mergulhar as raízes dos bons costumes até as embeber em princípios. Aí, no hábito se enxerta a convicção doutrinária, o que o enrijece. Com isso, a resistência do hábito ao ambiente dissolvente, já saudável, deixa o estado gelatinoso; cristaliza. Realço, cristalizar é construção gigante, começa lá na modelagem infantil, vara a vida toda; no exato, tem ponto de partida antes do nascimento, com a formação dos pais e professores. No inverso, aspecto esquecido e tantas vezes determinante da vida de pessoas e povos: depois de períodos de tensões fortes, sucede às vezes a calmaria com despreocupação generalizada; e daí a desmobilização dos espíritos. Nesse clima se dá com frequência a interrupção do processo de cristalização e pencas de hábitos bons se esvaem gradualmente; é desmoronamento paulatino, quase indolor, o mais das vezes.

Fenômenos de desmoronamento em parte decorrência da polarização manipulada já aconteceram, sua recordação serve de alerta pedagógico. Entre outros, ao longo dos séculos 19 e 20 atrapalhação sem fim carunchou a Espanha e teve efeitos arrasadores. Ali, o ataque preconceituoso à polarização, mais que nos Estados Unidos, foi arma de descrédito nacional e de demolição contra faixas conservadoras e até tradicionalistas. Por largos períodos a nação respirou um clima político corrosivo, fato tendenciosamente atribuído ao choque destruidor de las dos Españas. As guerras carlistas, três num século, 1833-1840, 1846-1849, 1872-1876 dessangraram a nação; parte enorme do sangue melhor foi sugado pela terra. Estourou a revolução republicana de 1868 e veio o deus nos acuda do sexênio revolucionário, 1868-1874. E então os desgastantes choques na época da dinastia de Saboia, 1870-1873, um emplastro que não curava nada. A 1ª República, 1873-1874, piorou a paralisação no governo e se alastrou que nem tiririca a impressão de que a urucubaca espanhola ia acabar nunca. Já em meados do século 19, a Espanha atordoada cambaleava exausta, triste España, unilateralmente estigmatizada de “nação moribunda” por corifeus da política e do jornalismo. Mais tarde, a república anticlerical de 1931 e a guerra intestina de 1936-1939 com sofrimentos e sequelas pavorosas. Veio a ânsia de nunca mais repetir o horror. E, bola de neve engrossando, setores nacionais importantes acharam que o país daquele jeito era inviável. Ou rejeitava princípios e condutas apontados em estridentes acusatórios facciosos como polarizadores, causa do entalo, ou ia remanescer sempre las dos Españas em autodestruição sem fim. Em parte pelos prolongados efeitos deletérios desse clima envenenado, a acomodação à modernidade revolucionária lá desemboca agora em maçaroca morna de relativismo, agnosticismo e costumes libertários. Ali boiam nacos do que outrora foi realidade generalizada, em que borbulhava religiosidade intensa, quase toda evaporada. Em perspectiva histórica mais esticada, o que restou do império de Carlos V em que o sol não se punha? Coisa parecida penou a Áustria, atacada como anacrônica e atravancante do progresso; antes cabeça, depois rabo. Após a 1ª Guerra Mundial virou republicano-socialista e miúda de importância. Todas as três, Estados Unidos, Espanha, e Áustria, potências conservadoras. Por processos de fundo parecido, os Estados Unidos, os anos voando, se não abrirem o olho, podem terminar nação esfarinhada; à vera, caudatária.

Um jeito de evitar desastres é começar por examinar na lupa as chefias do blocão conservador. Muita cristalização errada (origem de polarizações perigosas) vem de pregações furadas de mandachuvas contrafativos. São que nem gangrena, apodrecem a reatividade sadia, às vezes a desmoralizam; no avesso, dirigentes com ideias direitas energizam a reatividade no rumo certo. Fora os sintomas manjados positivos, feito líderes motivadores e de resultados, temos testes bons para julgar a sanidade de tais equipes dirigentes. Preliminar, olho no programa. Indícios de programa bom, encarece a pessoa, estimula seu desenvolvimento, de preferência às estruturas, acento na proteção à família; ampla difusão da propriedade. No mais, afinado com o princípio de subsidiariedade, fomento aos grupos sociais intermediários. E assim tem o Estado como ferramenta da sociedade. Coerente, espera mais da ação na sociedade que no Estado; este, contudo, valorizado com equilíbrio em sua indispensável e benéfica função supletiva de reparar, preparar e dinamizar. Sob o guarda-chuva do Estado parceiro, planos de assistência estatal para todos os desvalidos em qualquer proporção e condição, sim, os mais amplos possíveis, aqui de modo particular generosos e judiciosos programas de transferência de renda; entanto, que tais iniciativas, sem viés estatizante, alentem a autonomia pessoal, coarctando a dependência e o conformismo. Quanto à questão ambiental, sob a égide da qualidade de vida e do incentivo à economia, proteção efetiva à natureza. Tantos outros objetivos a examinar com os mesmos critérios, resumidos, sob um prisma, em sensibilidade social e estímulo à garra empresarial. Lideranças deste naipe açulam a reatividade boa.


Contrafativo vem de contrafação, parecendo, não é; não parecendo, é; casca brilhosa, miolo bichado. Significa impostura, caricatura, fraude. Caciques assim favorecem a cristalização das posições de seus adeptos em alicerces esburacados. São cúpulas deterioradas, pipocam daqui e dacolá. Também existem testes para constatar chefias bichadas. Tiro os critérios batidos, feito falta de norte e pregação desanimadora. Se o líder der positivo nesse outro tipo de teste, dos quais falo agora, luz vermelha. No que difunde, acento, claro, nos programas, mas até por gestos e atitudes, o dirigente contrafativo soca a estrutura antes da pessoa; e então, o Estado antes do indivíduo e da sociedade (Mussolini assim sintetizou a posição: Tutto nello Stato, niente al di fuori dello Stato, nulla contro lo Stato). Congruente, faz pouco-caso das sociedades intermediárias, modo especial, a família. Subestima questões doutrinárias e morais. Sua ação, tantas vezes pontuada de omissões escandalosas e reações com frequência desproporcionais, com o tempo, amolece a reatividade e em geral acaba por desmoralizá-la. Napoleão, o referido Mussolini e comandantes parelhos foram dirigentes contrafativos; macaqueação do que um bocado de ingênuos via neles e, então, trotava atrás. Porta arrombada, tranca de ferro.

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Os amanhãs obsoletos da América Latina

Os amanhãs obsoletos da América Latina

Péricles Capanema

Até mesmo fora de círculos ufanistas, a América Latina foi celebrada continente do futuro; hoje, tadinha, retardatária, é região de amanhãs obsoletos e melancólicos. Não sou de mascarar realidade, nem de minimizar perigos; sobre ela em sentido real se abriu a caixa de Pandora. Espiando mais de perto, sofre doença degenerativa; vai ficando para trás. A solução é sarar da mazela, até lá morreu Neves. Temos ali sociedade cada vez mais libertária, relativista e afundada em confusão religiosa espantosa. Para piorar, por décadas, países da região vêm sendo descaminhados por governos quando menos doidamente populistas e dirigistas. Tais governos em geral propugnam um nacional-desenvolvimentismo arrogante com escoro em montes de improvisações voluntaristas e autoritarismo minucioso. A versão alucinada é o castrismo; a pobre Cuba virou laboratório de mitomaníacos que, in anima vili, fizeram experiências sociais delirantes; a nação esfrangalhada está afundada na pobreza negra e na desagregação social; vive de esmolas: cubanos exilados, Venezuela, Rússia, Brasil, fora o resto. No carreiro, surtos de febre alta, feito o chavismo ou bolivarianismo, já serão daqui a pouco uns vinte anos de desgraceira cabotina, primeiro debaixo do relho do ditador desatinado, Hugo Chávez, um Perón bem mais doentio, sucedido pelo primário Nicolás Maduro. E, de passagem, largo de lado, já lá longe, governos com orientação afim, igual Torres, Velasco Alvarado, a política malucamente coletivista de Salvador Allende, batelada grossa engarranchada no atraso. Hoje em dia, inda na vanguarda do atraso, Evo Morales, Daniel Ortega, Rafael Correa, certo sentido, José Mujica. O Chile andava meio vacinado contra a toxina populista, mas logo pode ter recaída. Também demolidoras no seu conjunto as políticas de Lula e de Dilma, a dirigista desastrada, um Geisel piorado, do casal Kirchner e vai por aí afora. Costumo lembrar, é endemia de contágio fácil e cura difícil esta gororoba de nacionalismo, militarismo populista, marxismo, arremedos de cristianismo e guevarismo; doses diferentes em cada caso. Em amigações espúrias, grassa com frequência o auxílio de companheiros de viagem durante o ladeira abaixo; na resvaladura vão digerindo as apetitosas vantagens abocanhadas em troca do oportunista apoio oferecido. E ainda de incontáveis inocentes úteis, cuja colaboração ingênua pavimenta a via crucis das populações do continente. Até o momento, salvantes os irmãos Castro, cinicamente tiranos, essas ditaduras encapuzadas, desde a nascente useiras e vezeiras do totalitarismo normativo, são farsas que galhardeiam respeito pelas regras da democracia, enquanto, no encalço inescrupuloso da hegemonia, trabalham para acabar com a separação e independência dos poderes, sufocar a liberdade de imprensa, cercear a liberdade religiosa e a de expressão, eliminar o respeito aos contratos, suprimir as garantias à propriedade e tornar inócua a livre associação política. Eleições fraudadas no conteúdo de autêntica manifestação popular, mas em que se conservam as aparências da livre expressão dos votos, somadas à farsa grotesca do emprego direcionado dos instrumentos da chamada democracia participativa legitimam tais regimes aos olhos desatentos do mundo desenvolvido. A fórmula da derrocada, no substrato, é a mesma; varia só o grau da virulência. No comum têm à frente craques no ilusionismo político, fascinantes pajés de eflúvios apatetadores. Balançando com descaro a bandeira da pena dos pobres, da qual pretendem o monopólio, enfeitiçam as populações ao prometer satisfação imediata das necessidades mais urgentes, fundeados no mito voluntarista da onipotência estatal, a rançosa crendice no poder mágico do Estado ou do führer, duce, grande timoneiro, comandante, seja lá o que for. Com os problemas reais, o usual é escapulir deles irresponsavelmente pela política do avestruz. Outros sintomas da doença: a discurseira entulhada de compromissos ocos substitui as garantias reais aos investimentos privados, a gastança estatal asfixia os investimentos públicos, a incompetência e o ideologismo obcecado estancam na educação a melhoria do ensino e, normal, da qualidade da mão-de-obra; de mais, a política externa estribada na parlapatice terceiro-mundista faz escolhas danosas ao crescimento e à segurança do país. Na esteira, cascata de desgraças: produtividade estancada, competitividade prejudicada, marasmo econômico, deterioração do mercado de trabalho, desemprego maquiado, estatais viradas em mastodontes pesando na cacunda do povão, contas públicas em frangalhos encobertas por truques contábeis, total descrédito da política econômica com os homens da experiência e da ciência, serra acima no consumo de drogas, mocidade sem futuro, parte boa dos mais capazes se aventurando lá fora. Ainda sequelas desse curso, só mais irritantes: desabastecimento, racionamento crescente até de produtos básicos, tumefação da criminalidade. Por essas e outras, são décadas perdidas, com âncora nas armas (caso especial de Fidel Castro), assim como sobretudo em programas assistencialistas demagógicos que enleiam em boa medida um corpo eleitoral, com ilhas de exceção, pouco instruído, desinteressado dos assuntos públicos, fortemente sugestionável. Nesse clima, incha sem parar um fenômeno macabro, dele hoje são exemplos maiores Cuba e Venezuela (no mundo, a Coreia do Norte): a mordaça na sociedade, mantida apertada de jeito prevalente pelo expurgo dos opositores das posições de relevo e pela casta dos privilegiados, membros das nomenclaturas socialistas, modernos feitores da partidocracia pelega; são em verdade escravos-escravizadores encarapitados em postos de proa nas Forças Armadas, na administração pública direta e indireta, nas direções sindicais, bem como no Partido e até no Judiciário. A mais, no estirão liberticida proliferam enxames de tonton macoutes do oficialismo, as intimidantes milícias de adeptos brucutus, aterrorizando com sanha particular em bairros populares, bem como os pelotões das canetas alugadas na rede, nos jornais, revistas e TVs sabujas. Falta botar em destaque, num continente de ampla maioria de católicos, a já quase centenária faina da esquerda católica que ─ com lastro em noções furadas de caridade e justiça ─ contamina faixas largas do público, e com isso socorre o movimento esquerdista, com quadros de expressão, militantes a rodo e áreas de voto; de modo particular promovendo metamorfoses decisivas em correntes de opinião e até no temperamento público. Ao fortalecer orientações estatizantes que sufocam a prosperidade, a grande geradora de emprego e renda, atrasa a inclusão social. E com isso turbina brutal concentração dos ganhos e da propriedade nas mãos do Estado. Esbofeteia, assim, o princípio de subsidiariedade, presente de alto a baixo na doutrina social católica, que estabelece o papel suplementar do Estado em relação à família e demais sociedades intermediárias nas várias esferas da vida social. Na retórica, a opção preferencial pelos pobres; na prática, decênios de empedernida orientação que atrapalha a criação da riqueza. Na conta final, vem espoliando o futuro de milhões do seu direito básico de crescer na vida; tapa os ouvidos aos clamores autênticos dos pobres. Tal labuta do progressismo católico e de suas versões exacerbadas nas comunidades de base e nos teólogos da libertação tem sido o que mais prejudica o combate real à pobreza na América Latina. Reações e choques? Pois é, atinente ao Estado inchado e parasitário, cardumes enormes não relacionam o paquiderme estatal com o engessamento da economia e, inevitável, não enxergam relação de causa e efeito entre o estatismo desbragado e suas preocupações imediatas: emprego, saúde, moradia, transporte, carestia (primacial, a inflação dos alimentos), drogas, segurança, educação, ética. Reações ainda comuns, mas escapistas, o vezo da transferência de culpa pela invenção descarada de bodes expiatórios para os renitentes fracassos (capitalismo anglo-saxão, as 200 famílias, multinacionais, o polvo Light, os coronéis, as oligarquias, a educação hispânica, e vai por aí afora). Surgem ainda, agora sintomas bons, fortes especialmente em setores médios, nojo contra a corrupção, o favoritismo debandado, as relações promíscuas com organizações criminosas, o aparelhamento da máquina do poder, as gastanças demagógicas, os rombos orçamentários nos vários níveis da administração; igual os machuca a incompetência gerencial das despreparadas equipes de governo, redadas de apaniguados bisonhos das direções partidárias que tecem um compadrio de cumplicidades de arrivistas, aventureiros e ideólogos lunáticos e infestam com seu voluntarismo e improvisação os milhares de cargos de livre provimento. No curto, o crescimento dessas pobres nações no fim da fila, quando germina, vem da energia latente na sociedade, vencendo até mesmo a desorganização dos governos intoxicados por doses diferentes do esquerdismo populista. E já por dezenas de anos temos um continente emperrado, amontoando heranças malditas, via de regra se opondo ao esboroamento mais por espasmos temperamentais efêmeros, seguidos de desalentos, que por razões enraizadas em princípios, o que o atasca no lameiro a que foi empurrado.






sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

A escabrosa desapropriação da Fazenda Limeira

A escabrosa desapropriação da Fazenda Limeira

Péricles Capanema

A Fazenda Limeira é antiga, formada, tamanho médio, 363 hectares, ótima localização, à beira da estrada asfaltada que liga Pará de Minas a Tavares; fica a 6 quilômetros por asfalto da BR-262 e a uns 50 de Belo Horizonte. Há quatro gerações está na posse tranquila da mesma família, cujas mãos operosas ali produzem pacificamente desde a primeira década do século 20. Situação simpática e até com laivos de tocante. No Brasil de hoje, por incrível que possa parecer e por mais estapafúrdio que seja, azar dela. Misteriosamente, com obstinação delirante, grupo enquistado no INCRA e no Ministério da Reforma Agrária, cego por entranhado preconceito ideológico, quer expropriá-la na lei e na marra, maquinando manobras ao arrepio da lei e forjando cavilosamente expedientes escusos para, no final, lograr, com arrogância, pisotear direitos inconcussos, se analisados com isenção. Para tal, esbofeteia sem escrúpulos a legislação, o bem comum, o bom senso e a justiça. Em que pese a parlapatice, cada vez mais vazia, de que vivemos num Estado de Direito, até agora no caso, a patota expropriadora, agredindo diretamente ou ladeando ardilosamente a lei, tem conseguindo levar adiante seus intuitos demolidores. De maneira didática, vamos examinar a questão, em que se constata o cime permanente de um confisco cruel, desumano, injustificado. Nenhuma indenização na destruição da propriedadee produtiva. O crime permanente de um confisco que esbofeteou a lei, cruel, desumano, injustificado. Nenhuma indenização. Pretexto falaz: função social da propriedade. Motivo real: intervenção ditatorial do Estado para satisfazer imposições de movimentos revolucionários, comunistas. Efeito: destruição da produção, tensão na região, empobrecimento de modestos produtores rurais. Nem um tostão de indenização de ato tirânico perpetrado em 2004. Estamos diante de esbulho claro, retrocesso legal que se perpetua, expressão do atraso das políticas públicas no Brasil. Pequenos produtores foram excluídos do ofício, cortados de seu meio de vida, lançados injustamente na penúria, e seu torrão familiar foi ocupado por agitadores, incompetentes, meliantes, traficantes de glebas outorgadas pelo Poder Público, escorados em medidas disparadas pelo extremismo no poder. O entorno da propriedade antiga ficou desvalorizado.  Pela teoria dos motivos determinantes, a validade de um ato administrativo (no caso a desapropriação), está ligada os motivos indicados como seu fundamento. E todos os motivos foram falsos; ato administrativo nulo. É mais um exemplo doloroso da política de exclusão, regressiva ao extremo, praticada por ideólogos fanatizados, quando tomam o poder estatal. A ferida infecciona a região, é fator de inquietação, traz insegurança jurídica, inibe investimentos, impede a criação de empregos. Dessa forma, tal desapropriação fere a função social do emprego e da propriedade. Repita-se, o autêntico esbulho ali perpetrado diminui a oferta de emprego e comprime salários na região, bem como inibe a produtividade das propriedades naquela zona. Eliminar tal retrocesso constitui obrigação moral; avivaria o senso de justiça e manifestaria preocupação efetiva com os mais necessitados. Em suma, a devolução da propriedade a seus donos legítimos, medida de progresso e inclusão, traria a pacificação social à região.   

Um primeiro problema, a área é muito valorizada, está colada em Belo Horizonte e nenhuma tensão social ali existe. Só com muito desconhecimento da realidade e manipulações que fariam inveja a Maquiavel pode chegar a ser considerada como própria para reforma agrária. Mas a isso conduziu a obstinação febril dos, na prática, confiscadores profissionais, pagos generosamente pelo dinheiro do contribuinte. O hectare agrícola na beira da estrada asfaltada Pará de Minas-Florestal (Tavares fica na metade do caminho) está entre R$20.000,00 e R$40.000,00. É facílimo verificar, coisa de meia hora. Basta passar a mão num telefone e ligar para corretores de áreas rurais que trabalham em Pará de Minas, Florestal, Itaúna, Pitangui e até em Belo Horizonte. Então, por baixo, na bacia das almas, o hectare da Fazenda Limeira em média está valendo R$20.000,00. Caro demais, inabilita para a reforma agrária segundo a legislação vigente; em consequência, o INCRA, respeitando a lei, deve se desinteressar dela. Ponto final. Para os mitomaníacos da reforma agrária não importou, só contou a obsessão de expropriar. O INCRA fez pesquisa minuciosa, funcionários seus cochicharam evasivas esfarrapadas, à socapa ouviu gente, fez pesquisa direcionada com corretores, e finalmente a hoje para tantos sinistra repartição pública chegou à conclusão delirante que o hectare da Fazenda Limeira vale menos de R$8.500,00 (na sua exatidão mentirosa e minuciosa, R$8.458,75). De outro jeito, pisoteando a realidade, jogou lá para baixo a avaliação. Aqui está a primeira grande falsidade no caminho desta expropriação desmoralizante para a legislação brasileira. Falsidade fácil de ser desmentida: basta perguntar a dono de qualquer propriedade lindeira da Fazenda Limeira se ele, por este preço, menos de R$8.500,00 o hectare, está disposto a entregar o seu. Se o surpreso proprietário não achar que é piada, vai pensar que é caçoada ou até insulto. É óbvio que o espólio lesado vai contestar a avaliação insultante do INCRA. Com que eficácia? Só Deus sabe. Pela Portaria 7 de 31 de janeiro de 2013 do próprio INCRA e que deve ser obedecida nos processos de desapropriação é preciso precificar a terra “pelos valores atuais do mercado de terras”. Aqui, uma vez mais, o voraz órgão expropriador esbofeteou a legislação. Caso se consuma esta desapropriação sem base na lei, nascida da obsessão expropriatória de alguns funcionários bem colocados, ficará patente para o Brasil inteiro que a lei entre nós deixou de ter força. O arbítrio venceu. No século 18, um simples moleiro, diante da pressão de Frederico da Prússia, rei absoluto e grande guerreiro, de expropriar sua propriedade para ali fazer uma extensão do jardim do palácio de Sans Souci, negou argumentando que naquela terra seu pai havia falecido e seus filhos haveriam de nascer. O monarca absoluto insistiu, afirmando que poderia lhe tomar a propriedade. O moleiro respondeu tranquilo com palavras singelas, cujos ecos todos os séculos recolhem emocionados: Ainda existem juízes em Berlim. O rei desistiu, o moinho ficou no meio dos jardins, atestando o império da lei. Ainda existirão juízes no Brasil? É o que perguntam a justo título incontáveis produtores rurais alvejados pelo rancor ideológico de setores enquistados no aparato estatal.

Dos autos, recolho dois exemplos estarrecedores. Como apoio à desmiolada tese de que o hectare da Fazenda Limeira vale R$8.500,00, os autos trazem avaliação de outra fazenda, com este valor por hectare. Só que a propriedade está em Pequi, a quase 100 km de Belo Horizonte, parte da estrada de acesso é de terra (a Limeira fica a 50 km, tudo asfaltado) e a uns 40 km de BR-262 (a Limeira fica a 6 km). Outro exemplo, agora no rumo contrário. Foi feita pelo fiscal do INCRA em meados de 2011 a verificação do preço da fazenda Cana do Reino, esta sim, próxima da Fazenda Limeira, na mesma estrada, só que do outro lado da cidade; a rigor, um pouco mais distante de Belo Horizonte, mas também bem próxima da BR-262. De fato, a escolha no caso foi idônea, a comparação é válida, os pontos em comum com a Fazenda Limeira são muitos. Por descuido, parece, escapou no texto a pesquisa e surge de repente no meio do papelório enganador como normal o preço do hectare ali: R$50.000,00 o hectare. Vou repetir: R$50.000,00 o hectare, quando feita a comparação idônea. O fiscal do INCRA tranquilamente aceita que ali o preço, bem próximo da Fazenda Limeira e na mesma área, era mesmo de R$50.000,00 o hectare. E enfia nos autos. Por este preço a Fazenda Limeira valeria R$18.150.000,00 e não R$3.083.047,74 (6 vezes mais alta que a avaliação imposta com descaro e parcialidade gritante pelo INCRA). Será que as pessoas influentes no INCRA consideram os membros do Judiciário, do Legislativo e do Executivo totalmente ineptos para ajuizar em seus graves termos (graves aqui é eufemismo, deveria utilizar escandalosos) situação como essa? No maior descoco, colocam a avaliação de uma fazenda vizinha à Limeira, com características parecidas (terra, distância de Belo Horizonte e proximidade da BR-262) com o hectare 5,91 vezes mais caro que o preço que aceitaram pagar? Onde ficou a exigência legal de preço de mercado? A lei esbofeteada com atrevimento, aqui está uma escandalosa causa de anulação do processo.

Não parou aí a agressão minuciosa da injustiça armada com o braço do poder estatal contra os desvalidos, desarmados e atordoados proprietários tradicionais do estabelecimento rural (9 irmãos e a viúva meeira, que só querem a divisão tranquila de sua modesta terra entre eles para pacificamente poderem trabalhar e produzir). Pela mesma portaria acima referida o valor máximo que o INCRA pode torrar com cada assentado é R$80.000,00 (para o bioma da Mata Atlântica e outros espaços, valor de janeiro de 2013) e R$140.000,00 para as demais regiões. A Fazenda Limeira está no bioma da Mata Atlântica e na área do mapa do IBGE para a lei 11.428, que disciplina a espécie. Para evitar o teto de R$80.000,00, aplicável ao caso, e se ajeitar no mais cômodo de R$140.000,00 (janeiro de 2013), o INCRA, ─ é duro dizê-lo, mas é dever nosso ser escravos da realidade ─ falseando e enganando, com irregularidade gritante desconheceu os preceitos legais normativos no caso (bioma da Mata Atlântica, máximo de gasto R$80.000,00 por assentado, repico) e colocou a fazenda como pertencente às demais regiões. Só este fato é de molde a anular a malandríssima desapropriação. A mais, mesmo com os numerosos expedientes retorcidos, alguns dos quais veremos abaixo, o gasto por assentado ultrapassava muito o teto de R$140.000,00, já dito, inaplicável ao caso (ficou em R$178.178,00 com o hectare ali avaliado hilariamente a menos de R$8.500,00). O ministro interino da Reforma Agrária, utilizando prerrogativa legal, em setembro de 2013 autorizou arrebentar o teto, jogar para cima o gasto por assentado. Modo diferente, às favas o dinheiro público. É difícil não assomar a suspeita de que o ministro efetivo cheirou coisa mal feita e mais que depressa tirou o dele da reta. O ministro interino ficou com a batata quente na mão e inconsideradamente meteu a marreta no teto legal de gasto por assentado.

Tem mais. É normal que o assentado receba para cultivo o módulo rural da região, no caso 20 hectares. O módulo rural tem relação com propriedade familiar, cultivada pela família, apta para seu consumo, sustento e progresso. É tido como um pedaço pequeno que uma família cultiva sem recurso a mão de obra externa ou com pouco recurso a ela. Se o assentado recebesse o que seria normal, sua propriedade familiar, no caso os 20 hectares, pagos pelo preço de mercado o INCRA desembolsaria R$600.000,00 por assentado (caso de R$30.000,00 o hectare, 750% acima do teto) ou R$400.000,00 por assentado (caso de R$20.000,00 o hectare, 500% acima do teto). Nem falo do hectare acima de R$30.000,00, já negociado nesta faixa com frequência na região e nem sigo aqui a avaliação do próprio INCRA, constantes dos autos, da fazenda próxima à Limeira, a Cana do Reino, R$50.000,00 o hectare. E ainda estou muito bonzinho, não considerei as benfeitorias, das quais a propriedade está lotada: 3 casas boas, 2 casas menores, suinar (para os poucos que não conhecem a palavra, chiqueiro, mas enorme, coisa de 1º Mundo), 3 currais, pastos formados, pomar, viveiro de orquídeas e vai por aí afora. O próprio INCRA, na avaliação delirante, coloca o valor de R$461.318, 40 para as benfeitorias úteis e necessárias. De fato, por baixo, valem hoje mais de R$1.500.000,00. A soma total do INCRA, com mais alguns itens a indenizar, sobe para R$9.777,44 o hectare. Fica de novo evidente o disparate da desapropriação, menos para quem coloca a perseguição rancorosa ao produtor rural como obrigação ideológica prioritária e objetivo de vida. Por outro motivo relevante o INCRA fugiu dessa solução normal, 20 hectares para cada assentado. O mínimo por assentamento, constante da Portaria 5 de 31 de janeiro de 2013, é de 15 assentados em cada área desapropriada. Depois de considerada a reserva legal e a área de preservação permanente, sobravam só 160 hectares para assentar famílias. 15 x 20 = 300. E só existem 160. Ou seja, é inescapável, cada assentado tem de se contentar com menos de 10 hectares. O INCRA achou então que com 8 hectares para cada um já estava bem bom; dava e sobrava. 8 x 20 = 160. A conta fechou. De fato, arredondei para cima: o relatório do INCRA, de valor técnico inapresentável até para secundaristas gazeteiros, fala em “7,0 hectares de área líquida”. Encheu o processo de cálculos e perspectivas fantasiosas para provar uma situação que uma simples multiplicação já indicava como incontornável. Critério científico, como se vê. Fechou, em termos. Dois herdeiros do espólio vivem da propriedade há mais de 20 anos, têm preferência na hora da repartição. Outra herdeira tem residência na sede. Outra preferência na distribuição. Uma quarta herdeira, viúva, precisa para se manter da renda que aufere do aluguel de seu pedaço, divisão antiga, consensual entre os herdeiros. Sua área, intensamente explorada pelo locatário com técnicas modernas, com plantações de milho e sorgo doce de alta produtividade, aparece na estranha avaliação do INCRA como pasto. Vai ela também ser expulsa aos pontapés e deixada ao relento? Mais um problema a discutir. Na prática, vai sobrar bem menos de 160 hectares para a divisão. Qual o motivo da encarniçada desapropriação, desmiolada para uma pessoa de bom senso, senão a obstinada caça ao produtor rural e moldar o campo segundo uma utopia que invariavelmente se revelou empobrecedora onde foi aplicada?

O INCRA inventou, mais uma vez com base em análises laboriosas, supostamente técnicas, que a área do assentamento se destinará acima de tudo ao cultivo hortigranjeiro. Aparece então o plano futuro, polo de hortigranjeiros, no espetacularmente inepto relatório, de um primarismo boçal (perdoem-me a palavra forte, é forçosa, reflete até de maneira insuficiente a realidade; é triste constatar tal nível num órgão que deveria ter pelo  menos um pouco de seriedade técnica, mas basta abrir os autos para sofrer em saraivada as agressões das bobagens ali empilhadas como justificativas da desapropriação, que acarretará a desdita, quem sabe por decênios, de família honrada, grande e antiga conhecedora das lides do campo). Para mostrar o futuro do assentamento ali planejado, o deprimente texto fala então da suposta “vocação da região para as atividades de hortigranjeiros”. Descobriu a América! É preciso avisar já, na correria, arfando de contentamento, aos fazendeiros da região, esta novidade fulgurante, a boa nova de muito esperada por eles, para a qual, pobres cegos, nunca tinham atinado: eles têm ‘vocação” para plantar alfaces, nabos, rabanetes. Todo mundo na região da Fazenda Limeira sabe, ali nas propriedades se criam porcos, frangos, gado leiteiro; plantam-se milho, sorgo, feijão. Em nenhuma das propriedades lindeiras da fazenda expropriada há grande cultivo de leguminosas. Só hortinhas. Razão? Claro feito água do pote: dá prejuízo, de outro jeito, não é viável economicamente. Nenhum dos fazendeiros pé na terra jamais sonhou em fazer dali um polo produtor de couves e cenouras. A miragem delirante sonhada pelos dirigentes do INCRA, bem agasalhados em bons apartamentos das cidades grandes, seria ter lá na frente 160 hectares lotados sobretudo de alfaces e nabos. Sempre foi assim, nas salas esfumaçadas dos técnicos mitomaníacos da microexploração se desenham cenários róseos a partir de premissas fantasiosas delirantes, cuja base é o desconhecimento rombudo da realidade dura do dia a dia do produtor rural. Faltou aos estudos uma coisa básica: ver o que existe, perguntar aos sofridos fazendeiros que trabalham por ali se o plano do polo das alfaces tem alguma chance de dar certo. Mas como o dinheiro usado no assentamento vai ser público, não tem problema, não vai doer no bolso de ninguém. Só no do pagador de impostos que vai ver pelos anos afora mais um ralo onde seu dinheiro escoará sem utilidade nenhuma. Na exatidão, a possibilidade próxima, risco sério, é a criação de mais uma favela rural, igual às centenas em que se transformaram incontáveis assentamentos Brasil afora. Podem escrever e me cobrar depois. A terra morrada da Limeira, com poucas aguadas, se não for eliminada uma injustiça que clama aos céus, vai deixar as mãos de antiga e laboriosa família de ruralistas que nela labuta por quatro gerações, gente do ramo, com tarimba e ciência (um dos herdeiros que trabalha todos os dias naquela terra é veterinário conhecido e respeitado na região; outro cursou Economia), agora escorraçada aos pontapés pela corriola fanatizada pelo preconceito, infelizmente enquistada em postos influentes no INCRA e no MDA. No lugar da experiente família ruralista, o INCRA vai socar ali uns 15 ou 20 pobres coitados ─ na melhor das hipóteses, é o que mostra a triste experiência, pois com frequência entre os assentados escolhidos constam desordeiros, basta falar com quem conhece por dentro a sombria realidade dos assentamentos ─, de escassa instrução, sem vivência séria na agricultura, que em geral não conseguem diferenciar um pé da mandioca-mansa de um da mandioca-brava. É política social ou, na verdade, mais um caso de generalização da irresponsabilidade, do desperdício de dinheiro público e da pobreza?

A mais, algum ambientalista acredita à vera que os supostos 15 ou 20 assentados vão respeitar a minuciosa e estrita legislação que regula a exploração agrícola nos biomas da Mata Atlântica? E reparar o passivo ambiental constatado? No caso, para os obcecados expropriadores não tem importância alguma a facilmente previsível agressão às leis que preservam os escassos resíduos da Mata Atlântica em Minas Gerais.

Agora, o que fazer. Simples, fazer justiça. No caso, restabelecer a ordem lesada: suspender e depois extinguir o processo; a seguir, cancelar a desapropriação. É o que os homens de bem esperam da isenção animada pelo senso grave da ordem, o mais amplo possível, do douto Julgador e da sensatez dos políticos de valor autêntico, evitando que a injustiça estadeie impune seu triunfo e, com isso, se agravem indefinidamente a dilaceração social e o esbanjamento do dinheiro público. Aqui o número do processo de desapropriação da fazenda Limeira: 46397-47.2013.4.01.3800. E, in extremis, um apelo que ecoa a voz de milhões de brasileiros de espírito reto e coração bom: Presidenta Dilma, em cujas veias corre sangue de valorosos ruralistas do Triângulo, com equidade e coragem moral, dizei uma só palavra e impedireis a consumação de uma injustiça monstruosa que, independe de nós, no futuro será julgada como mancha purulenta e indelével de seu governo. Em hora que se valoriza o papel da mulher na sociedade e no Estado, da qual V. Exa. é exemplo, este gesto apaziguador, brotando da equidade, colocaria em destaque uma das mais importantes características femininas, que tanta falta faz em todos os âmbitos, a particular sensibilidade em mitigar a dor. Traria de imediato a justa e longamente esperada tranquilidade para filhas, mães, esposas e avós, hoje, contra a lei, sufocadas por angustiosa insegurança, caminhando sob o peso da cruz em calvário sem fim. Que Deus tenha pena de todos os injustiçados do Brasil.