Eleições
na bica
Péricles
Capanema
No Brasil
teremos eleições municipais em 15 de novembro; nos casos de 2º turno, ainda em
29 de novembro, votações para prefeitos. Sem dúvida importantes, fornecerão estimativa,
instantâneo, de como se posiciona a opinião pública e tornarão mais plausíveis
os prognósticos para 2022.
Aqui as
eleições brasileiras serão tocadas de raspão, não é sobre elas que pretendo discorrer.
Eleições presidenciais norte-americanas serão o tema. Muita gente já comentou
em blague, repito o gracejo, as eleições presidenciais nos Estados Unidos
influenciam tanto, que todo mundo deveria votar delas.
A
conhecida revista inglesa “The Economist”, em sua última avaliação sobre o
pleito de 3 de novembro próximo coloca Joe Biden com 54% dos votos populares,
Trump com 46%. Ainda segundo “The Economist”, de momento Biden tem 90% de
chances de ser o próximo presidente dos Estados Unidos (98% de probabilidade de
vencer no voto popular).
Se os
atuais prognósticos foram confirmados, e não é difícil que o sejam ▬ ainda que
pesem sobre eles as justificadas reservas sobre a objetividade das pesquisas ▬,
Biden chegará ao poder à frente de gigantesca coligação que incluirá, apenas
como exemplos, simpatizantes do movimento vandálico de derrubada de estátuas, setores
extremados do “Black Lives Matter”, defensores da pauta LGBT, ideologia do
gênero, aborto. E ainda forças políticas que simpatizam com partidos de esquerda
na América Latina. Em outro âmbito, presumivelmente ficarão mais fáceis as
manobras de Xi Jinping e Vladimir Putin para expandir a própria influência e
minar a importância dos Estados Unidos no mundo. Queira-se ou não, terão sido enormes
golpes nos interesses do Ocidente, eco pálido (a demolição interna é enorme) e,
paradoxalmente poderoso (engloba países de grande poder) do que foi a
Cristandade. Enormes golpes, disse; reafirmo. Presumivelmente desferidos de
forma gradual, passamos por era girondina. E possivelmente menos contundentes
para a opinião pública pela restauração parcial, quando menos publicitária, do
papel internacional dos Estados Unidos, com a recusa do “America first”.
Adiante. Descendo
a detalhes e analisando de perto o período pré-eleição, Joe Biden tem contra si
a falta de carisma, o ar distante e a aparência um tanto avoada. Não galvaniza seguidores,
eleitores potencialmente seus poderão não se sentir animados a votar no 3 de
novembro. Contudo, tais circunstâncias devem ser vistas com olhar matizado. Biden
sabe ganhar eleições. Senador aos 30 anos, venceu a seguir seis disputas
sucessivas para o Senado; e por duas vezes, junto com Barack Obama, foi
vitorioso em eleições presidenciais. É nome nacional desde 1973.
Católico,
não age na política de forma coerente com a fé, tendo tido choques com o bispo
diocesano, por causa de seu favorecimento do aborto. Semanas atrás, declarou
que agirá contra os estados da União que promulgam leis restritivas ao aborto:
“Os direitos à saúde das mulheres estão sob ataque quando estados no país
inteiro aprovam leis extremadas restringindo o direito de escolha das mulheres
sob quaisquer circunstâncias”. Continuou: “Como presidente vou colocar na
legislação o determinado pela decisão Roe v. Wade da Suprema Corte e o
Departamento de Justiça fará tudo que estiver a seu alcance para impedir a
avalanche de leis estaduais que tão claramente violam o direito de escolha das
mulheres”. Suas posições pró-aborto e favoráveis ao “same sex marriage” podem
lhe tirar votos; é forte o eleitorado conservador nos Estados Unidos.
Joe Biden tem histórico familiar amplo
e controverso. Alguns fatos o favorecem eleitoralmente; outros podem
prejudicá-lo, em proporção ainda não conhecida. Casou-se em 1966 com Neilia
Hunter. Tiveram três filhos, dois meninos e uma menina. A mulher e a filha, em
1972, morreram em desastre de automóvel. Biden casou-se uma segunda vez, em
1977, com Jilly Tracy, com quem teve uma filha. O filho mais velho de Biden, Beau,
faleceu de câncer aos 46 anos. O outro filho, Hunter, ▬ observa o sociólogo
Manuel Castells, favorável a Biden, em “La Vanguardia” de Barcelona ▬ “uma bala
perdida, expulso da Marinha por vícios em drogas e envolvimento em negócios com
empresas chinesas e depois ucranianas, que lhe pagavam salários astronômicos
por ter um Biden em
seus conselhos. Isso explica o escândalo da negociação de Trump com o presidente da Ucrânia para que lhe facilitasse
informação sobre Biden
júnior em troca de ajuda, um assunto que levou à acusação de impeachment contra
Trump”. De momento, as estrepolias do
filho parecem não prejudicar significativamente a candidatura do pai. Os
Estados Unidos têm outras preocupações, em especial a crise econômica e a
pandemia.
Uma palavra sobre
Donald Trump. Mesmo sem mudanças ideológicas e de aspirações no eleitorado, a
crise econômica e a decepção com o comportamento presidencial podem lhe tirar votos
decisivos. E, então, reitero, pode começar uma época particularmente difícil:
liberdades ameaçadas, crescente desagregação social, ameaças de totalitarismo caminhando
a nosso encontro.
Percebo, não
despertei esperanças róseas, e fico sujeito à censura de atrair, quiçá
prematuramente, o olhar do leitor para perspectivas sombrias. Errei? Não me
parece. Em primeiro lugar, não é tão prematuro assim, as eleições estão na bica.
E a seguir, tudo o indica, teremos avalanche de fatos que, já agora, precisam
ser entendidos, combatidos e detidos quanto possível. A mais, pode-se alegar em
favor de tal atitude exemplo histórico de um grande vitorioso. Sem ele, a
história da liberdade e das democracias ocidentais teria sido outra. Quando
ascendeu ao cargo de primeiro-ministro, no discurso inaugural de 13 de maio de
1940, julgou Winston Churchill necessário para enrijecer a fibra britânica e
preparar o país para uma luta vitoriosa expor de forma escancarada a realidade
sombria: “Só tenho a oferecer sangue, sacrifícios, lágrimas e suor. Temos
diante de nós provação muito dolorosa. Diante de nós estão muitos e muitos
meses de luta e sofrimento. Qual é nosso objetivo? Fazer a guerra por terra,
mar e ar. Guerra com todo o nosso poder, com toda a força que Deus nos deu.
Guerra contra uma tirania monstruosa nunca suplantada no escuro e lamentável
catálogo dos crimes dos homens. Esta é nossa política. Qual é nosso objetivo?
Respondo com uma palavra: a vitória. Vitória. Não importam os custos, apesar de
todos os sofrimentos. Vitória, ainda que o caminho seja longo e duro. Sem vitória,
não há sobrevivência”.
“Proportione
servata”, se as considerações acima valem para a situação geral, valem também para
os dias difíceis que podem estar diante de nós no Brasil, em consequência das
eleições de 2020 e 2022.
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