domingo, 13 de fevereiro de 2022

Brasil em péssima companhia

 

Brasil em péssima companhia

 

Péricles Capanema

 

Liberdade econômica no mundo. Sediada em Washington, a Heritage Foundation, think tank conhecido e respeitado, defensor da liberdade econômica, de outro modo, da propriedade privada e da livre iniciativa, publicou seu índice (pontuação) anual de liberdade econômica de 2021 (Index of Economic Freedom, está na rede). Estão listados 178 países, desde os que mais favorecem o empreendedorismo e a iniciativa econômica, até os que reprimem brutalmente a liberdade de o homem empreender, crescer, ser dono de bens e garantir o futuro para si e sua família. De outro modo, no fundo, resumidamente, livre iniciativa versus comunismo.

 

Critérios do índice. O indicador é composto de muitos componentes, considera vários critérios, aqui só vou informar o índice síntese (ou pontuação, ou escore). Ele vai de 0 a 100. Considera país livre, isto é, com espaçosa liberdade econômica, o que obtiver pontuação de 80 a 100. A pontuação de francamente livre ou via de regra livre vai de 70 a 79,9 (mostly free). O país que está entre 60 e 69,9 tem o rótulo moderadamente livre (moderately free). O que se espreme entre 50 e 59,9 é classificado como em geral não-livre (mostly unfree). De 49,9 a 0, (repressed) reprimido, país de fato sem liberdade econômica real.

 

Cingapura campeã, Coreia do Norte lanterninha. O primeiro posto da listagem pertence a Cingapura (89,7), cidade-estado de 5,6 milhões de habitantes, no mundo o país que mais estimula investimentos e emprego; breve, ativa o crescimento pela proteção da propriedade privada e da livre iniciativa. O segundo lugar é da Nova Zelândia (83,9). A Suíça (81,9) está em quarto. Relação das vinte primeiras posições: Cingapura, Nova Zelândia, Austrália (82,4), Suíça, Irlanda (81,4), Taiwan (78,6), Reino Unido (78,4), Estônia (78,2), Canadá (77,9), Dinamarca (77,8), Islândia (77,4), Georgia (77,2), Ilhas Maurício (77,0), União dos Emirados Árabes (76,9), Lituânia (76,9), Holanda (76,8), Finlândia (76,1), Luxemburgo (76,0), Chile (75,2), Estados Unidos (74,8). Importa notar, existem na lista três países que foram comunistas, vegetavam no pântano soviético e, em redondos trinta anos, adotaram medidas que os colocaram no topo do grupo dos países que estimulam a prosperidade de suas populações. Breve, aplicaram na legislação cavalo de pau vigoroso e dispararam no rumo oposto. Vamos agora para o fim da lista, o charco da paradeira. O país de economia mais fechada no mundo [melhorando, do conjunto dos países pesquisados, dos quais é possível obter dados suficientes] é a Coreia de Norte (5,2). Não espanta. Está no 178º lugar. Até o começo da década de 50, as duas Coreias (que ainda não existiam) tinham nível econômico semelhante. Hoje, embora os dados não sejam muito objetivos, estima-se em geral que o PIB per capita da Coreia do Sul seja 20 vezes o da Coreia do Norte. Em 177º aparece a Venezuela (24,7). O antepenúltimo é Cuba (28,1). São os mais fechados, coletivistas, próximos ao comunismo integral, locais de repressão, miséria e falta de perspectivas para o povo. Os dois da América Latina são modelos para o PT e xodós de Vladimir Putin, seu grande protetor. E da China também.

 

Brasil em má companhia. Já sei, o leitor está querendo saber onde está o Brasil. Já digo, está em colocação deprimente em 2021, o 143º de 178, pontuação 53,4 (mostly unfree). Os anos anteriores trazem pontuação e colocação semelhante. Estão em condição melhor que o Brasil na lista de 2021 (claro, nem vou falar que em posição honrosa estão todos os países ricos do mundo), entre outros: Bulgária, Cazaquistão, Polônia, Romênia, Eslovênia, Croácia, Hungria, Mongólia, Rússia, Egito, China, Camboja, Ucrânia. Paro por aqui, sem deixar de notar numerosos países que fugiram do comunismo há pouco e hoje têm economia mais abertas que o Brasil. É de corar frade de pedra.

 

Somos pobres por opção.  Aqui vão as pontuações do Brasil a partir de 2010 no Index of Economic Freedom: 2010 (55,6); 2011 (56,3); 2012 (57,3); 2013 (57,7); 2014 (56,6); 2015 (56,6); 2016 (56,5); 2017 (52,9; 2018 (51,4); 2019 (51,9); 2020 (53,7). Antes de 2010 não era muito diferente. Outrossim, estamos empantanados em pontuações próximas a 49,9, começo da zona dos países não-livres. Não espanta que Paulo Guedes tenha dito dias atrás que a extração do petróleo poderia ser até quatro vezes mais rápida se a Petrobrás estivesse em mão privadas. E que a Eletrobrás precisa investir 15 bilhões de reais por ano, mas só consegue aplicar 3 bilhões. “Precisamos libertar (privatizar) a empresa ou ela vai ser reduzida à insignificância.  Somos pobres por opção”. Lamentou desconsolado a não privatização da Eletrobrás e Correios que espera acontecer em 2022: “Esperamos que em quatro anos consigamos vender duas estatais. Não é possível que um governo que se elegeu prometendo isso [a privatização], não possa vender duas empresas que estão descapitalizadas e não conseguem manter suas fatias de mercado.” Como fundo de quadro, havia a constatação, levantada pela reportagem: no governo Bolsonaro, nenhuma estatal foi vendida. Apenas como comparação, durante o primeiro governo de FHC foram vendidas 80 estatais. E Salim Mattar, batalhador pela iniciativa privada, lamentou sua credulidade: “O governo não é liberal e eu acreditei no candidato Bolsonaro. No candidato que falava em privatizar a 'TV da Dilma', a empresa do trem bala. Mas foi um discurso de campanha”.

 

Sair do atoleiro. Posta a situação, não é fácil sair do brejo ▬ fonte de sofrimento popular, renda baixa, menos empregos. O Brasil em 1980 era 50º na renda per capita. Hoje, é 85º. Contra essa tendência mórbida de estatização e intervencionismo (engessamento da economia), com inevitável empobrecimento da população, temos no Brasil fortes correntes de opinião partidárias da livre iniciativa e da propriedade privada. Penso, faltaria ainda enfatizar suficientemente a importância central do princípio de subsidiariedade, que aponta o papel supletivo do Estado em relação à sociedade. E aqui a defesa de política enérgica de privatizações. Sei bem, a entrega de setores e empresas estatais para a iniciativa privada não esgota o programa de liberdade econômica, e muito menos engloba agenda inteira de restauração social, mas é imprescindível e constitui sintoma importante do rumo geral.

 

Retificar rumos e ampliar horizontes. Pouco antes de morrer, diante de três ex-ministros do governo Bolsonaro (Abraham Weintraub, Ricardo Salles e Ernesto Araújo), Olavo de Carvalho teve reparos que apontam para necessidade premente de retificar rumos e ampliar horizontes, ouvidos aliás em silêncio pelos mencionados antigos participantes do governo: “A briga já está perdida. Não existe direita, só bolsonarismo”. De outro modo, falta formação doutrinária, posições claras em um leque grande de matérias, articulação. As ponderações suscitam temas de reflexão para quem aspira ver o Brasil no rumo certo. Martelo, refletir, pensar. A ação virá logicamente depois; e aí terá impacto maior. A propósito, sempre me impressionaram particularmente comentários do prof. Plinio Correa de Oliveira sobre a maneira de agir do marechal Ferdinand Foch (1851-1929), sob algum ângulo, o vencedor da 1ª Guerra Mundial. Dali eu recolho: “Foch, homem imperturbável. [...] a regularidade e a calma geram um clima de confiança e serenidade, condição essencial para se realizar um trabalho sério. Ou, muito mais do que isso, uma luta séria. Porque lutar é mais do que trabalhar. Mais do que lutar, é pensar; e mais do que pensar, é rezar”. Concluo, reafirmo o convite inicial: refletir a respeito dos temas suscitados na matéria, mas acrescento adento imprescindível: rezar, com fé. Que Deus nos ajude.

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