Péricles Capanema
Na entrevista
coletiva de 29 de agosto, por ocasião do lançamento de seu livro, José Dirceu foi
didático: “Temos um programa radical e a maioria do Parlamento precisa ser combinada
com uma grande pressão popular”. Como exemplo de pressão popular, citou o cerco
da militância à Câmara e ao Senado. A intimidação de legisladores ▬, aqui entra
o uso inescrupuloso de dossiês, às vezes chega até a ameaças à família,
sequestros e morte ▬ constitui tática revolucionária antiga, empregada na
Revolução Francesa, a torto e a direito na Revolução Comunista e, mais
recentemente, amplamente utilizada na Venezuela. Aplicá-la no Brasil é
congruente com as raízes doutrinárias do PT, na prática o sucessor do Partido
Comunista. Basta que a ocasião se apresente e seja politicamente conveniente. O
leninismo continua vivo.
José Dirceu se
dirigia em especial a petistas e a membros de correntes ideológicas a ele
próximas; em verdade anunciava plano de transformar o Brasil tão logo factível em
uma Venezuela ▬ a marcha do radicalismo goela abaixo do povo rumo ao
bolivarianismo. Para tanto, estimulava a militância a procurar eleger tantos
quantos possíveis para a Câmara e o Senado, ademais de tentar colocar Haddad no
segundo turno das próximas eleições. E aí fazê-lo vitorioso. O dirigente
petista acha que haveria suficiente transferência de votos de Lula para seu
ungido (ou seu poste), o que lhe garantiria a vaga em 28 de outubro: “Para a
margem de transferência de votos ser dentro do que a gente espera, 20 ou 30
dias são mais que suficientes. A Justiça decidirá até 17 de setembro. Teremos
tempo para cada eleitor tomar conhecimento de que Lula é Haddad e Haddad é
Lula”.
Observou, ladino: “Eu
não diria que é um programa com a faca no dente, porque esta expressão é
praticamente de confronto aberto”. Caso se despisse da cautela de político
matreiro, diria a realidade, é programa faca no dente, não há dúvida. Outra
questão é se a liderança do PT conseguirá executá-lo, não dependerá apenas do
fanatismo revolucionário de dirigentes e militância e dos que de que disponham.
Como reagirá o povo?
O PT tem cartas boas
na mão em seu intento de venezuelizar (ou cubanizar) o Brasil. Faz décadas (já
era assim no período militar), a esquerda, em seus vários graus de
radicalidade, “grosso modo”, domina a universidade, os seminários, as redações
e os clubes grã-finos. É um câncer que deitou gigantescas metástases e que só
poderá ser curado por trabalho ideológico sério ao longo de anos e anos a fio. Não
é rósea nossa situação. Kerensky pavimentou a via para Lênin; os girondinos
facilitaram o caminho para os jacobinos. O Brasil, triste sina, está apinhado de
kerenskys e de girondinos. Não constroem estradas, mas as pavimentam, para que
outros nelas trafeguem.
Um exemplo, talvez o
mais conhecido. Na Jovem Pan, FHC comentou a possibilidade do segundo turno
entre Bolsonaro e Haddad ou entre Bolsonaro e Alckmin. Perguntado sobre possível
aliança entre PT e PSDB, respondeu sereno: “Espero que o PSDB vá para o
segundo turno e acho que o PT espera a mesma coisa, mas dependendo das
circunstâncias, eu não teria nenhuma objeção a isso”. A declaração irritou
apoiadores de Alckmin; afinal, era o maior líder tucano confessando, a vitória
petista não despertava objeção nele. FHC precisou arranjar uma saída de
momento. Contudo, a posição de FHC não deveria surpreender, era coerente com princípios
seus e conduta.
Existem nas situações acima ventiladas consonâncias profundas quanto a
objetivos. “Pas d’ennemis à gauche” ▬ Não há inimigos à esquerda, lembrando
fórmula cunhada em fins do século 19. Em encontro com intelectuais no Rio de
Janeiro, abril de 2014, ambiente descontraído, FHC se deixou levar: “Hoje,
se eu disser que sou de esquerda, as pessoas não vão acreditar. Embora seja
verdade. É verdade!”. Prosseguiu: “O Chávez só
me chamava de 'Mi maestro'. Eu dizia para ele: 'Baixinho, por favor’”.
Falava de consonâncias. Elas
influenciam fundo, por vezes são determinantes nas atitudes.
Via de regra, contudo,
para os revolucionários, é melhor que tais sintonias passem despercebidas, pois
podem chocar opinião pública desavisada. “Baixinho, por favor”. quando não é
possível escondê-las, é sempre a diretriz. A nossa bússola, para esclarecimento
do povo, aponta rumo oposto, brado alto e nítido contra o conluio deletério, ainda
para muitos oculto. O artigo já estava pronto quando houve o horrendo atentado
contra Jair Bolsonaro. Graças a Deus, depois da angústia inicial, parece que caminha
bem sua recuperação. O artigo continua atual, talvez tenha até aumentado de
atualidade. Não julgo que deva modificá-lo.
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