Socialismo: doutrina lá em baixo, mentalidade lá em cima
Péricles Capanema
A queda do Muro de Berlim,
novembro de 1989, simbolicamente foi o grande marco da derrocada dos regimes
socialistas da Europa Oriental. Na ocasião, ruiu como castelo de cartas o
comunismo na maioria dos países do Leste Europeu, de outro jeito, os regimes de
inspiração socialista que nunca engrenaram. Poucos anos antes, agosto de 1984,
haviam sido chibatados pelo então cardeal Josef Ratzinger como vergonha de nosso
tempo. O Purpurado lembrou ainda que, dominadas
pelo socialismo real, penavam nações inteiras em condições de escravidão
indignas do homem. As receitas do socialismo real, invariavelmente estatizantes, foram rota infalível
para a ruína. Seu fracasso estrepitoso deixou rastro de sangue, ditadura e
fome.
Logo depois entrou na moda a
expressão o fim da História, raiz
hegeliana, cunhada pelo historiador Francis Fukuyama para indicar que a
democracia liberal e o capitalismo já não tinham opositores da importância e
passavam a ser vitoriosos perenes. Expressão que, aliás, desapareceu do mapa,
já sumiu também o otimismo ingênuo que foi seu caldo de cultura.
O socialismo real, de outro jeito, o socialismo como existiu
historicamente, fracassou de vera? Fracassou, não dá para encapotar, produziu
miséria e ditadura nos países em que foi aplicado. Gerou desalento e vergonha
até mesmo em correntes de esquerda e seus defensores mais cegos via geral estão
mal à vontade ao justificá-lo. Até na infeliz Cuba se arrastam raquíticos
ensaios de propriedade privada e livre iniciativa para tentar arrancar o país
do atoleiro. E começam a ser aplicados na Coréia do Norte pelo mesmo motivo.
Numa palavra, socialismo real ═
atoleiro. E também ficou desmoralizado o marxismo, invocado sempre como
justificação teórica.
Fracassou o comunismo? Aqui a
questão é outra. Em termos, sim. Em termos, não. O capitalismo é julgado pelos
resultados, as utopias são julgadas pelas aspirações; o comunismo é uma utopia
igualitária e coletivista. E as aspirações comunistas são vistas como nobres por
muita gente: liberdade, igualdade, fraternidade. Aliás, para a maioria dessa
muita gente, o ideal se resume num ponto: o comunismo tem pena dos pobres.
Importa pouco ou nada no caso que onde foi aplicado quem mais sofreram foram os
pobres.
Nos escombros do socialismo real medra a utopia igualitária
e remanesce o que, certo sentido, é o mais importante: a mentalidade
socialista. Ele embebe, em graus diversos, multidões sem fim, até mesmo muitos
dos mais ativos adversários do comunismo. Gente com essa mentalidade privilegia
as estruturas sobre a pessoa, o Estado sobre a sociedade, as soluções de força
sobre as soluções de base moral; congruentemente, subestima a importância da
família, sobrevaloriza os fatores econômicos sobre os religiosos e morais.
Enfim, tem simpatia por soluções coletivistas. Esse sem número de pessoas
embebidas de mentalidade socialista é caldo de cultura potencialmente
ativíssimo, dependendo de circunstâncias hoje imprevisíveis, para experimentos
socialistas que deixarão, de novo, rastros de sangue, miséria e tirania.
Nenhum comentário:
Postar um comentário