segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Socialismo: doutrina lé em baixo, mentalidade lá em cima


Socialismo: doutrina lá em baixo, mentalidade lá em cima

Péricles Capanema

A queda do Muro de Berlim, novembro de 1989, simbolicamente foi o grande marco da derrocada dos regimes socialistas da Europa Oriental. Na ocasião, ruiu como castelo de cartas o comunismo na maioria dos países do Leste Europeu, de outro jeito, os regimes de inspiração socialista que nunca engrenaram. Poucos anos antes, agosto de 1984, haviam sido chibatados pelo então cardeal Josef Ratzinger como vergonha de nosso tempo. O Purpurado lembrou ainda que, dominadas pelo socialismo real, penavam nações inteiras em condições de escravidão indignas do homem. As receitas do socialismo real, invariavelmente estatizantes, foram rota infalível para a ruína. Seu fracasso estrepitoso deixou rastro de sangue, ditadura e fome.

Logo depois entrou na moda a expressão o fim da História, raiz hegeliana, cunhada pelo historiador Francis Fukuyama para indicar que a democracia liberal e o capitalismo já não tinham opositores da importância e passavam a ser vitoriosos perenes. Expressão que, aliás, desapareceu do mapa, já sumiu também o otimismo ingênuo que foi seu caldo de cultura.

O socialismo real, de outro jeito, o socialismo como existiu historicamente, fracassou de vera? Fracassou, não dá para encapotar, produziu miséria e ditadura nos países em que foi aplicado. Gerou desalento e vergonha até mesmo em correntes de esquerda e seus defensores mais cegos via geral estão mal à vontade ao justificá-lo. Até na infeliz Cuba se arrastam raquíticos ensaios de propriedade privada e livre iniciativa para tentar arrancar o país do atoleiro. E começam a ser aplicados na Coréia do Norte pelo mesmo motivo. Numa palavra, socialismo real ═ atoleiro. E também ficou desmoralizado o marxismo, invocado sempre como justificação teórica.

Fracassou o comunismo? Aqui a questão é outra. Em termos, sim. Em termos, não. O capitalismo é julgado pelos resultados, as utopias são julgadas pelas aspirações; o comunismo é uma utopia igualitária e coletivista. E as aspirações comunistas são vistas como nobres por muita gente: liberdade, igualdade, fraternidade. Aliás, para a maioria dessa muita gente, o ideal se resume num ponto: o comunismo tem pena dos pobres. Importa pouco ou nada no caso que onde foi aplicado quem mais sofreram foram os pobres.

Nos escombros do socialismo real medra a utopia igualitária e remanesce o que, certo sentido, é o mais importante: a mentalidade socialista. Ele embebe, em graus diversos, multidões sem fim, até mesmo muitos dos mais ativos adversários do comunismo. Gente com essa mentalidade privilegia as estruturas sobre a pessoa, o Estado sobre a sociedade, as soluções de força sobre as soluções de base moral; congruentemente, subestima a importância da família, sobrevaloriza os fatores econômicos sobre os religiosos e morais. Enfim, tem simpatia por soluções coletivistas. Esse sem número de pessoas embebidas de mentalidade socialista é caldo de cultura potencialmente ativíssimo, dependendo de circunstâncias hoje imprevisíveis, para experimentos socialistas que deixarão, de novo, rastros de sangue, miséria e tirania.

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