Amadurecimentos esperançosos
Péricles
Capanema
Um quarto
de século tem o Plano Real. O Brasil, antes do real ▬ que passou a ser nossa
moeda em 1º de julho de 1994 ▬, era de um jeito; ficou de outro depois dele. Em
1994, inflação ainda descontrolada, brandindo programa radical Lula caminhava
para ser eleito em outubro. Sob o clima do real, inflação estancada, sensação
de ordem, esperança renovada, FHC ganhou as eleições em 1º turno com 54,24% dos
votos, ficou oito anos no Planalto e só entregou o poder ao PT em 1º de janeiro
de 2003.
Hora de
parar e pensar sobre aspectos importantes que mudaram no Brasil, em especial os
empurrados para a sombra. Bom apoio para reflexões é a recente entrevista do
economista Pérsio Arida, ex-presidente do Banco Central, um dos pais do Plano
Real, estampada nas páginas amarelas da Veja.
Naquela
ocasião, 1994, o estatismo se esgueirava envergonhado pelos cantos no Primeiro
Mundo. Caíra a Cortina de Ferro e escancarara o atraso e a miséria do
socialismo; ainda sopravam os ventos de liberalização econômica dos governos de
Ronald Reagan (1981-1989) e Margareth Thatcher (1979-1990). Entre nós, sina de
retardatários, soprava ainda forte o vendaval insalubre do estatismo, impedindo
avanços civilizatórios.
Assim comentou
Pérsio Arida as vendas de estatais na esteira do Plano Real: “As privatizações
da Telebrás, dos bancos estaduais, da Vale do Rio Doce. Era tudo tão difícil
que precisava de força policial na porta da Bolsa de Valores para segurar os
leilões”. Vamos reter o “era tudo tão difícil”. Observa ainda o economista: “Curiosamente,
a maior oposição foi do PSDB de São Paulo, pois queríamos privatizar os bancos
estaduais”. Em postura regressista, continuavam aferrados ao estatismo todo o
bloco esquerdista [não mudou] e igualmente um embolorado nacionalismo
estatizante, ufanista, romântico e dogmático. Por isso “era tudo tão difícil”.
A desestatização
avançou pouco, retrocedeu no período petista, persiste o dinossauro estatal e,
indício claro de retrocesso, a Petrobrás ainda refina quase 100% do petróleo. Mas,
em medida dinamizadora, a estatal anunciou que em aproximadamente dois anos,
vai vender para a iniciativa privada oito refinarias, em torno de 50% da
capacidade de refino do Brasil, o que, junto com outras medidas, trará concorrência
para o setor da energia ▬ maior produção e preços mais baixos. Entre as medidas
complementares anunciadas, o governo tentará executar o projeto intitulado “O
Novo Mercado de Gás” para terminar com o virtual monopólio de produção,
transporte e distribuição exercido pela estatal.
Constam
do programa a venda de transportadoras e distribuidoras de gás da Petrobrás,
bem como novos regulamentos que diminuirão a intermediação, dando maior força
ao consumidor e ao vendedor final. A União pretende estimular a venda de
distribuidoras, hoje nas mãos de Estados da federação. O setor terá novos
participantes, concorrência acirrada e se espera que o preço da energia baixará
enormemente. Com isso, estímulo para a produção e enriquecimento geral da
população.
“Era tudo
tão difícil”. Era, hoje não é mais, está relativamente fácil privatizar, a oposição
ficou menor e menos encarniçada. São avanços importantes, amadurecimentos na
opinião pública que despertam esperanças. Esperanças que o público, melhorando
em suas orientações, estimule um rumo em que o papel indispensável do Estado
seja subsidiário. E que a sociedade, com base familiar, se fortaleça. É avanço
civilizatório, trará recursos para realizar mais largamente a justiça social.
Trato
agora de outra matéria, relacionada com a anterior, mas onde a maturação vem
sendo lenta. Faz falta avançar célere, abandonar a molecagem destruidora, a
esbórnia e assumir por inteiro para bem do Brasil a maturidade produtiva. Maturar
é crescer. Em especial os pobres do campo têm direito a esse aperfeiçoamento.
Desde os
anos 50 sobre o Brasil despencaram sucessivos e amalucados programas de reforma
agrária, cujo efeito é invariavelmente baixíssima produtividade, disseminação
de favelas rurais, fuga de capitais no campo, burocratismo, empreguismo e
gatunagem. Programa delirante de atraso ainda que inconfessado, seus efeitos
estão à vista nua: dinheirama pública torrada irresponsavelmente, bilhões e
bilhões, favelas rurais, bagunça, favoritismo e roubalheira. É preciso eliminar
esse recuo da vida brasileira, acabar com tal involução renitente. Já há numerosos
e sérios estudos a respeito, economistas e agrônomos apontam o disparate desse amazônico
gasto despropositado. Décadas e décadas de disparates e dilapidação de recursos
num programa que nos envergonha em qualquer cenário internacional idôneo. Se nem
um tostão tivesse sido desperdiçado nessas maluquices, a situação dos pobres no campo seria hoje melhor, a produtividade mais
alta, teriam sido atendidos melhor a saúde e a educação para o povo em geral.
Aqui, um
obstáculo grosso ao progresso nacional. Como base dessa regressão, em rápidos
traços acima recordada, que já chamei de tumores de estimação, temos legislação
demolidora, parte constitucional, parte infraconstitucional, entulho que torna
inseguras as relações jurídicas, inibe a produção de alimentos, dificulta a verdadeira
justiça social no campo. Pior, tal legislação tóxica poderá ser utilizada no
futuro por governo de esquerda [será, logo que a oportunidade surja] para jogar
o Brasil no caminho de Cuba e da Venezuela. Não custa lembrar, Salvador Allende
fez assim no Chile; sem modificar a legislação, apenas lançando mão de vigentes
“resquícios legais”, impôs violento programa de expropriações e estatização.
A bancada
ruralista tem mais de 250 representantes (Câmara e Senado juntos). Luta por
financiamentos melhores, subsídios, preços compensadores, portas abertas lá
fora para exportação da produção, interesses imediatos. Certo. Todavia, com
momento favorável a suas reivindicações, revela apatia com interesses mediatos,
ou, por outra, fundamentais, de longo prazo. Não existe nenhuma comissão ou
grupo de estudo ▬ e ninguém sequer trata do assunto ▬, de homens da ciência e
da experiência, que compulsem toda a legislação vigente, pente-fino, para dela tentar
expungir por meio de pertinentes propostas legislativas [PECs e projetos de
lei] tudo o que ali fede a intervencionismo e coletivismo; enfim, a socialismo.
Por baixo, evidencia imaturidade, medo de andar fora da trilha do politicamente
correto e não só da classe rural, mas da opinião pública conservadora em geral.
Falava acima de amadurecimento esperançoso. Constato aqui imaturidade decepcionante.
Nelson Rodrigues dizia: “Jovens, envelheçam rapidamente”. É o caso de reclamar:
“Brasileiros, amadureçam rapidamente”. Em tudo.
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