Juízes federais enodoados
como facínoras
Péricles Capanema
O PT lançou a campanha “Cadê a prova?”. Que prove do próprio veneno, faço
a mesma pergunta tendo como objeto o manifesto “Eleição sem Lula é fraude” lançado
em 19 de dezembro último, que está sendo largamente difundido ▬ adesões, nem tanto,
até agora menos de 200 mil, apesar da propaganda maciça e facilidade de
firmá-lo. Conta com assinaturas de políticos, celebridades, empresários, entre
eles, José Mujica, Cristina Kirchner, Rafael Correa, Chico Buarque, Celso
Amorim, Fábio Konder Comparato, Noam Chomsky, Luís Carlos Bresser Pereira e vai
por aí afora. Em resumo, o texto é uma vergonha de português, lógica e probidade.
A frase inicial é uma tolice palmar: “A tentativa de
marcar em tempo recorde”. Ninguém tentou nada. Houve, isso sim, decisão pública,
o julgamento está marcado para 24 de janeiro, começará às 8h30 na sala de sessão da 8ª Turma, na sede do Tribunal Regional Federal da
4ª Região (TRF4), em Porto Alegre.
Logo a seguir, mentira deslavada, “em tempo recorde”. Vai contra os
fatos. A defesa do ex-presidente Lula peticionou ao TRF-4 levantando a suspeita
de que era inusitada a pressa com que foi marcado o julgamento do recurso. A resposta
da Corte, pelo seu presidente, 113 páginas, esfarinha a alegação de pressa
indevida (está na rede). O manifesto das esquerdas mundiais (vamos batizá-lo assim)
por probidade deveria quando menos aludir ao mencionado texto. Nem uma palavra.
Et pour cause.
Segundo o desembargado Thompson Flores, “o requerente, em síntese,
questiona a celeridade impingida ao processamento”. Destaco alguns trechos da peça:
“Destarte, o tempo de processamento da Apelação Criminal nº
5046512-94.2016.4.04.7000 perante esta Corte não fere o princípio da isonomia.
Como já referido, 1.326 apelações criminais foram julgadas por este tribunal no
ano de 2017 em tempo inferior àquele em que se realizará o julgamento da
Apelação Criminal”. Afirma ainda que se, por acaso, tivesse havido celeridade
inusual, atenderia a diretriz do Conselho Nacional de Justiça. Seria portanto ato
de obediência e disciplina: “A Meta 4 do CNJ diz in verbis: Priorizar o julgamento dos processos relativos à
corrupção e à improbidade administrativa”.
Ainda a respeito, a resposta transcreve parte da situação atestada em inspeção
recente do Conselho Nacional de Justiça no gabinete do desembargador João Pedro
Gebran Neto: “Observa-se que tanto os processos antigos quanto os mais recentes
estão sendo devida e diligentemente julgados”. De outro modo, a celeridade,
comprovada em inspeção oficial, é característica do gabinete que vai julgar a
apelação apresentada pelos advogados de Lula. E conclui o desembargador: “A
celeridade no processamento dos recursos criminais neste Tribunal Regional
Federal constitui a regra e não a exceção”.
Retorno ao manifesto de português primário, lógica estropiada, carente de
escrúpulos: “A tentativa de marcar em tempo recorde para o dia 24 se janeiro a
data [quis dizer, para 24 de janeiro o julgamento] em segunda instância do
processo de Lula nada tem de legalidade [quis dizer, nada tem de legal]. Ou
seja, o documento garante sem nenhuma prova, sequer o mais tênue indício, que o
TRF-4 agiu fora da lei.
Continua o tal manifesto: “Trata-se de um puro ato de perseguição da liderança
política mais popular do país”. Puro ato de perseguição, a saber, sem nenhuma
base jurídica. Retorna a acusação gravíssima, o juiz Sérgio Moro e os
desembargadores do TRF-4 são marionetes a serviço de uma força aqui inominada
que persegue Lula. De novo, cadê a prova? Cadê o mais tênue indício?
O texto continua desembestado em
português pavoroso e na mesma falta de escrúpulos: “O recurso de recorrer ao
expediente espúrio de intervir no processo eleitoral sucede porque o golpe do
Impeachment de Dilma não gerou um regime político de estabilidade conservadora
por longos anos”. Vejam bem, lançar mão de expediente espúrio no caso equivale a
determinar a condenação no julgamento do recurso. Onde fica a probidade dos
magistrados, pintados aqui como paus-mandados para qualquer tarefa suja? Cadê a
prova?
Agora, olhar rápido na redação, deixo
de lado muita coisa, o português está no mesmo nível da decência do texto. “O
recurso sucede”; “a trama de impedir a candidatura de Lula vale tudo”. “A trama vale tudo”,
vale até redação de chorar. E nessa trama, o manifesto não diz desse modo por não
conseguir exprimir com clareza ▬ atrapalhado pelo primarismo boçal da redação ▬
mas quis dizer, “[vale a] condenação no tribunal de Porto Alegre”. De novo, o
insulto, o TRF-4 retratado como marionete de trama ignóbil. Quem maneja a trama
tem os juízes na mão. Eles fariam, por dinheiro, ou pelo que seja, o que lhes
for ordenado.
Para vergonha dos brasileiros que prestam, acusação desse naipe, infelizmente
avalizada por figuras em destaque no Brasil e no Exterior, reverbera com maior
facilidade nas redes sociais, nas conversas, na imprensa tradicional, enfim em
todos os lugares. Trabalha a favor de generalizado enxovalhamento do Judiciário.
O mesmo: “Mais que um problema tático ou eleitoral, vitória ou derrota,
nossa luta terá consequências estratégicas e de longo prazo”. “Mais que um
problema nossa luta terá consequências”. Entendeu alguma coisa? Nada, claro. Não
é para entender, a redação é disparatada de alto a baixo.
A peça demagógica e delirantemente acusatória só não tem provas e
português minimamente apresentável. Aliás, vou ser modesto. Já me contentaria
com indícios, mesmo os mais tênues. Cadê o mais tênue dos indícios do que acusa
copiosamente?
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