Tumores de estimação
Péricles Capanema
Pivô do mensalão, ex-deputado federal e presidente do
PTB (a partir de 14 de abril) Roberto Jefferson, agora livre, concedeu
entrevista ao Estadão. Falou o óbvio: “Quem financia partido são as estatais.
Se queremos país moderno, vamos ter que fazer privatização, porque não vai
permitir a concentração da corrupção. A estatal é a semente da corrupção no
Brasil. Partidos disputam cargos nas estatais para seu financiamento. O que vão
assaltar nos seis meses enquanto durar o impeachment é uma loucura”. O petrolão
deita raízes na Petrobrás. Os jornais falam do eletrolão, com origem na
Eletrobrás. Bastaria investigar, em cada estatal vai ser descoberto o mesmo
esquema de pilhagem que por anos jugulou a Petrobrás e a Eletrobrás.
Agravando o quadro, a Petrobrás (quer dizer, o governo
petista) está pedindo empréstimos bilionários ao CDB (Banco do Desenvolvimento
da China, estatal chinesa, braço do PC), já são mais de 10 bilhões de dólares. Só
um exemplo, em 26 de fevereiro passado, a Petrobrás informou haver contraído empréstimo
de 10 bilhões de dólares. Antes, em abril de 2015, foi anunciado financiamento de
3,5 bilhões de dólares. Uma das condições para receber a dinheirama é comprar
equipamentos chineses para o setor petrolífero, o que contraria a política de
conteúdo nacional, legislação patrocinada pelo próprio PT. Neste caso, o PT e o
governo se calam sintomaticamente, pois aqui eles estão favorecendo o
imperialismo comunista. E, sob outro ponto vista, já revelando traços de
deplorável conduta de país neocolonizado, temem desagradar a potência
colonizadora. Quando inevitável, a Petrobrás paga as multas prescritas pela
legislação brasileira e compra o material chinês.
Infelizmente menos que deviam repercutem no público os
descalabros das estatais, entre os quais, a roubalheira endêmica e, como acima,
ser instrumento da política de servidão do Brasil a potências estrangeiras.
Também incomodam aquém da medida seu empreguismo e ineficiência. Em
consequência, é relativamente raro entre nós algum partido ter como bandeira
programática a privatização e, com isso, propor como política de Estado a
eliminação desse gigantesco fator de atraso. Deveria ser normal, prestigioso,
aplaudido de pé. Parece, não dá voto. No governo, nem se fala, mas mesmo na
oposição a Petrobrás ainda é qualificada aqui e ali de “orgulho nacional”.
Vem de longe o lamentável xodó com o estatismo. Desde a
Revolução de 1930, a fórmula preferencial, simplificadora e deformante, tem sido:
“Apareceu um problema? Estado nele”. Revela sujeição, maior ou menor, ao lema fascista:
“Tudo no Estado, nada contra o Estado, e nada
fora do Estado”. E tal lema exprime com autenticidade a doutrina e a
mentalidade do nazismo, do comunismo e de socialismos de várias tonalidades. O
tenentismo brasileiro, autoritário e intervencionista, de tanta presença em
nossa história, também bebeu dessas águas.
Existem motivos vários para a pervivência (desculpem o
castelhanismo expressivo, deveríamos adotar essa palavra, viver, muitas vezes com
esforço, através dos tempos; sobrevivência não diz a mesma coisa) dessa situação.
Um deles, quem sabe o principal, é o mimetismo, a mania subserviente de imitar
fórmulas de fora. Embeiçados por modelos vitoriosos passageiramente no estrangeiro,
tentamos sua aplicação aqui. Aconteceu com o fascismo, o socialismo, o comunismo
e numerosas outras fórmulas coletivistas, de diferente teor estatizante.
Deixaram entre nós sequelas profundas em especial nos setores letrados (ou mais
ou menos letrados). No povo simples, nem tanto. A brasilidade, hoje falada,
começa com autonomia de pensamento e segurança de conduta. Aliás, vale para
qualquer povo.
Roberto Jefferson falou do financiamento dos partidos.
Referia-se, creio, sobretudo ao financiamento das campanhas, caríssimas entre
nós. Nada foi feito para diminuir-lhes o custo. Medidas óbvias, como a proibição
da marquetagem na televisão e providências por muitos vistas como sensatas para
baratear campanhas, como o voto facultativo e alguma forma de voto distrital, dormem
nas prateleiras. Uma determinação vale: proibido o financiamento empresarial num
país em que, todos sabem, é pífio o financiamento de particulares. O que sobra para
financiar as campanhas, caras como antes, e que fracassarão inelutavelmente sem
o dinheiro? Mais financiamento público (dinheiro tirado de escolas, de postos
de saúde e de creches, entre outras fontes), continuação da propina fluindo das
diretorias das estatais e, já que a fonte secou em parte, complementos advindos
de dinheiro estrangeiro e do narcotráfico. São perspectivas dantescas, reconheço,
mas não sejamos como os avestruzes.
Volto ao começo. O Estado é realidade necessária e
saudável, mas com presença em geral supletiva. As soluções devem via de regra sair
do setor privado. É o que fez grandes os Estados Unidos. E é o que, aliás, afirma
o princípio de subsidiariedade da doutrina social católica. Sem que ele nos
encharque as mentes e molde as mentalidades, vamos ter ainda por muitos anos no
corpo do Brasil nossos tumores de estimação, correlatos, o estatismo, o coletivismo,
o intervencionismo e o dirigismo. Entranharam-se por décadas, deitaram
metástase, são de penosa extirpação.
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