Rápida desilusão do crédulo
Péricles Capanema
Currículo impressionante. Henrique Meirelles foi presidente do Banco
Central no governo Lula, secretário da Fazenda em São Paulo no governo Doria e
ministro da Fazenda no governo Temer. Antes, fizera carreira como banqueiro internacional,
chegando a presidente do Banco de Boston. São funções, se bem executadas,
incompatíveis com credulidade, ingenuidade e precipitação. Candidato à
Presidência, um de seus slogans foi “Chama o Meirelles”; isto é, quando a
situação ficar preta, ainda existiria saída, chamar o Meirelles.
Apoio desconcertante, com ufana e confessada
base na realidade. O
financista só agiria com base nos fatos, infenso às ilusões, refratário às expectativas
vazias. Ou enganosas. Meados de setembro último, dias antes do 1º turno, o
antigo ministro da Fazenda se apressou em declarar apoio a Lula. Ensaiou tomada
de posição retumbante, contribuiu para diminuir temores nos setores mais
ligados à livre iniciativa, em especial mercado financeiro ▬ mais ainda, no
Brasil inteiro. Meirelles esperaria contrapartidas? Compromissos? Teria
recebido promessas de retificação de rumos? Algum dia talvez a História revele
conversas e acordos de bastidores, cumpridos ou abandonados. O antigo
presidente do Banco de Boston exsudava segurança e confiança: “Quero me ater a
fatos específicos e que mostram a comparação brutal. Quando trabalhamos juntos
no governo, trabalhamos oito anos. Nesse período, mais de dez milhões de
empregos foram criados, isso é um fato, não é questionável”. Continuou
acelerado no mesmo rumo, crescimento, retirada de pessoas da pobreza: “Durante
aquele período, além de um crescimento forte, inflação na meta”. Aproveitou para
criticar a inflação atual, “corrói todo o padrão de vida da população".
Proclama de novo, os fatos estão na origem do
apoio enfático. O que
interessa são os fatos, assegura, com esteio neles vamos ter avanços em
ambiente favorável à geração de emprego e renda. E então, de novo, diante de
Lula, mostrou que o caminho aparecia ensolarado: “Isto é, na minha opinião, o
que interessa. Eu olho e vejo o resultado do seu governo, isso nos faz estar
aqui. Estou aqui com tranquilidade, com confiança, porque eu sei o que funciona
e o que pode funcionar no Brasil”. Ele sabe, é do ramo. Confiante, tranquilo,
dava o diapasão para o Brasil na possível administração petista. Voltou às loas
dias depois: “Meu apoio ao Lula deriva da minha confiança na possibilidade de ele
agir para mudar esse quadro. De entender o que é necessário ser feito e de
fazer o que é suficiente para recuperar a nossa economia. Com responsabilidade
fiscal e social. Eu tomo decisões baseado em fatos e isto ocorreu quando ele
foi Presidente”. Apoio com base em fatos, reafirmava. Acenava a investidores: “Hoje,
o nível de confiança do investidor no nosso País é baixo. É o que acontece,
quando há dúvidas sobre o cumprimento de compromissos, sobre o respeito a
regras. Quando não há previsibilidade e confiabilidade na condução da economia.
Quando as políticas fiscal e monetária caminham em sentidos opostos”. Lula
permanecia tergiversando, fugindo de compromissos, pedindo união pela
democracia aos nvos convertidos. Mas só.
Fatos? O caminho hoje já não se apresenta ensolarado. Está sombrio, destino
incerto. O fato bruto e chapado, incontroverso era e continua o mesmo, a
ambiguidade permanente e a desconversa contínua de Lula. Não se comprometeu com
nenhum programa econômico. E nem vai se comprometer. O PT tem pronto seu plano econômico
de governo (e das outras áreas também), vai aplicá-lo. Rui Falcão, ex-presidente
do PT, um dos chefes da campanha, avisou há pouco aos navegantes ainda inadvertidos:
“O que se cobra do Lula é assumir um programa que não é o nosso". O
programa “nosso” não será modificado, vai ser aplicado, já o foi nas
administrações passadas. É regressivo, intervencionista, estatizante; e assim,
pela fuga de capitais e pouca inovação, empobrecedor. Receita para o atraso. Menos
investimentos, menos empregos, salários com viés de baixa. Como historicamente
aconteceu nos países que atraem a admiração petista, Cuba, Venezuela,
Nicarágua, entre outros, atolados no retrocesso e na exclusão das grandes
maiorias das rotas que levam ao crescimento e à prosperidade.
A desilusão. O tom de Meirelles mudou. Não só o tom, o conteúdo
também. Ele “caiu na real”, A menos de quinze dias do segundo turno, os ouvintes
eram membros da conceituada consultoria Eurasia Group, quando Henrique
Meirelles, talvez inadvertidamente, confessou que agira com escasso ou nenhum
discernimento poucos dias antes.
Gato por lebre. Palavras do homem que se gabava, só
acreditava em fatos: “A eleição é muito apertada
neste momento. As chances de Lula são maiores, mas ainda acredito que o
presidente Jair Bolsonaro tem uma chance real de vencer” Meirelles dividiu o
período petista, 14 anos, em três governos diferentes, o primeiro, com
responsabilidade fiscal, o segundo, com certo afrouxamento fiscal, o terceiro
recessivo. E observa: “A grande questão agora é qual Lula tomará posse. Se você
pegar seu atual programa de governo, seria uma má notícia”.
Retrocesso na economia. Segundo
Meirelles, de momento, o mais provável é termos de engolir uma “má notícia”, no
caso da vitória de Lula, está vitorioso o terceiro período. O programa
econômico anunciado é intervencionista e estatista, desestimularia a iniciativa
privada. Rui Falcão já avisou, o programa é o “nosso”. Meirelles julga que o
programa foi elaborado com concepções que predominavam no período Dilma Rousseff:
“Quem desenvolveu o programa foi um grupo de economistas que acreditam
fortemente no papel do Estado e das empresas estatais na promoção do
desenvolvimento. Essa visão prevalece neste momento”. Pairava no ambiente um
dado talvez promissor, o novo Congresso tem feitio conservador. Pontuou
Meirelles: “Minha resposta para saber se ele [o governo] se tornaria mais conservador por causa dos
resultados do Congresso é não".
A realidade esbofeteada. Em suma,
em seu apoio açodado (pouco refletido, para dizer o mínimo) à volta de Lula, Meireles
deu as costas para os fatos, estapeou a realidade, deixou-se embair por patranhas
ilusionistas. Sua credulidade não apunhalou apenas ele. Foi além, corroeu no
público resistências à agressão não somente estatizante em curso, à vera
totalitária, travestida, na tentativa de vencer oposições enormes, de roupagem
democrática e pena dos pobres. Resistências hoje mais necessárias que nunca.
Nenhum comentário:
Postar um comentário