A demolição dos irrefletidos
Péricles Capanema
Irreflexões e imaturidade suicidas. “Noblesse oblige”, adverte o ditado francês. A posição,
a idade, o conhecimento, a experiência obrigam quem os têm a comportamento
maduro, cuidado especial, prudência. Circunspecção, olhar ao redor. Paulo
Guedes, sob vários aspectos, é o principal ministro do governo. Já foi mais importante,
mas ainda é figura pública do primeiro plano brasileiro. Para ele, é o que
parece, nada disso terá importância; “noblesse n’oblige pas”.
Pitacos em barzinho de Ipanema. A sensação que se tem, ao sofrer o impacto ácido de certas
declarações do ministro da Economia, é de que ele se sente entre amigos num
barzinho de Ipanema, tomando seu chopinho, dando pitacos inconsequentes no meio
de gargalhadas. Gosta das frases de efeito, encanta-lhe “épater les bourgeois”,
soltar ditos inesperados que, parece, considera brilhantes, merecedores de
admiração. É do grupo dos que perdem o amigo (no caso, muito mais que amigos, lesiona
posições louváveis que afirma defender), mas não perde a piada (na situação, frases
que, provenientes do ministro Posto Ipiranga, fortalecem os adversários do regime
da propriedade privada, da livre iniciativa e das liberdades naturais).
Caminho de destruição. Nada lhe importa ▬ é a triste constatação imposta pela
realidade patente ▬, continua seu pipoqueio perturbador, amontoando frases de
efeito. Infelizmente, para desgraça do país e das causas que defende, tem agido
repetidas vezes como um irrefletido, intelectual de pensamento superficial e homem
público irresponsável, pertinazmente incapaz de medir os estragos gerados por
ditos que amputam parte da realidade, via de regra a mais importante, e realçam
aspecto dela, em geral secundário. Será
pretensão oca ou tendência ao exibicionismo? Sei lá. De qualquer maneira, este
homem inteligente vai se mostrando inepto para a vida pública. Na prática, dói
dizê-lo, age como demolidor de posições que afirma defender.
Outro tiro no pé. Novo pipoco, é de dias atrás, e, supostamente, deve
estar satisfeito em ter empilhado mais frases de efeito: “Não se iludam: a
China [...] é socialista só no nome. A China é um capitalismo selvagem. É um
capitalismo de dois séculos atrás. É o capitalismo que faziam os ingleses.
Comércio com o mundo inteiro, rapidamente, sem encargo trabalhista, sem leis
salariais, sem previdência, nada disso. É o capitalismo selvagem, é o mergulho
nos mercados globais, com muita competência, com muita eficiência. 3,7 bilhões
eurasianos estão saindo da miséria porque mergulharam na economia global.
Enquanto estavam no socialismo, existiam miséria e fome na China. Quando
entraram nos mercados globais, nunca tanta gente saiu da miséria naquela parte
do mundo”. À vera se ilude quem acha que na frase acima palpita realismo; existe
romantismo simplificador, do real foram amputados brutalmente as partes mais
decisivas.
Pensar é matizar. Nunca tanta gente saiu da miséria (sem contextualizar e
simplificando eufórico). Ampliemos sem euforias apressadas, mas com realismo o
quadro, simplificações nem sempre ajudam. Suas declarações prestigiam, ainda
que parcialmente, regime que é ditadura de partido único, coletivista,
imperialista. O Partido Comunista Chinês, dono do governo em Pequim, age, no
longo prazo, para enfiar o Brasil em sua área de influência, transformando-o
virtual ou realmente em protetorado. Pequim se coloca cada vez mais contra Washington,
em cujas costas estão, por imposição histórica, a defesa das liberdades
naturais no mundo. Nada disso parece valer para o Posto Ipiranga. Ele acha
bonito surpreender, chocar, divertir imaginados amigos de um fictício bar em
Ipanema. E com isso prestigia o regime chinês que tira da miséria bilhões de
seres humanos.
Dilma Rousseff e Paulo Guedes aqui empurram o
carro numa mesma direção. A ex-presidente
Dilma, nos mesmos dias, também se julgou obrigada a prestigiar o regime chinês.
Agiu coerente com sua história. A socialista radical, que nunca renegou as
ideias que outrora a precipitaram no terrorismo assassino, proclamou: “A China
representa uma luz nessa situação de absoluta decadência e escuridão que é
atravessada pelas sociedades ocidentais. Não se pode deixar de admirar um país
que sai do feudalismo, do mais brutal controle colonialista, para se tornar a
segunda maior economia do mundo e a primeira em paridade de poder de compra. E
tudo indica que, até o final da década, poderemos ver a China se transformar na
maior economia do mundo. Há toda uma gama de preconceito e sujeito oculto no
caso do desenvolvimento da China, pelo menos da perspectiva dos países
ocidentais. Temos que entender a relação entre o partido e os instrumentos de
Estado da superação da pobreza.", disse.
Ditirambos ao caminho chinês para o
socialismo de Estado. Dilma Rousseff participava do lançamento (um
debate) pela Editora Boitempo (comunista) do livro “China, o Socialismo do
século 21” de autoria de Elias Jabbour e Albeto Gabtielle. Do debate participou
também Silvio Almeida, articulista da “Folha”. O livro destaca o papel do
Estado e do Partido Comunista Chinês na vida econômica daquele país. Jabbour,
ligado ao PC do B, afirmou: “A China realizou inovações institucionais que
foram realocando o papel do Estado. Temos um CEO [presidente executivo] ligado
ao Partido Comunista Chinês em cada empresa, isso é algo interessantíssimo”. O
PT admira e louva sem cessar a ditadura chinesa, cuja ação constitui sem dúvida
um farol a iluminar sua ação política no Brasil.
Useiro e vezeiro. Em 14 de fevereiro de 2019, três anos atrás, em números
redondos, postei artigo intitulado “Simplificações demolidoras”. Erra parecido
com o acima. Tratava de outra declaração desastrada de Paulo Guedes, no caso ao
“Financial Times”. Ei-la: “Pessoas de esquerda têm miolo mole e bom coração. Pessoas
de direita têm a cabeça mais dura e coração não tão bom”. Mostrei, com base na
lógica e em exemplos históricos, a falsidade da afirmação. E observei: “É o gosto
da boutade, dirão alguns, o ministro é chegado numa, não deixa passar a ocasião.
Admito, mas atenua o desastre? [...] Paulo Guedes não é um ministro qualquer perdido
por Brasília, tem grande agenda que pode fazer o Brasil voltar a crescer e, com
isso, tirar do buraco a milhões de pobres. Agiria melhor se fugisse de boutades,
frases irrefletidas e análises superficiais, que, sem que ele o queira, admito sem
problemas, levam água para o moinho do lulopetismo”. O ministro pelo jeito,
infelizmente, não se emendou, continua o mesmo. Não está sozinho, tem
companhia. Pobre Brasil, que tem em seus postos de direção, aos montes, figuras
públicas que estadeiam eufóricas irreflexão e irresponsabilidade, indiferentes
aos desastres que possam provocar ou até deles inconscientes.
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