O Arcebispo
esbofeteia impiedosamente a verdade
Péricles Capanema
“Neste momento, os que melhor aplicam a doutrina
social da Igreja são os chineses”. Chineses aqui são o Partido Comunista da
China e o governo da China Popular. O autor da frase é o arcebispo dom Marcelo
Sánchez Sorondo, chanceler da Pontifícia Academia das Ciências e da Pontifícia
Academia de Ciências Sociais. Argentino como o Papa Francisco, é tido como
conselheiro próximo do Pontífice.
Meses atrás o Prelado visitou rapidamente a China, foi
recebido com salamaleques em visita controlada e agora, repentinamente,
resolveu falar. Desembestou nas bajulações escandalosas: “Os chineses buscam o
bem comum, subordinam as coisas ao bem geral. Encontrei uma China extraordinária,
o que o pessoal não sabe é que o princípio central chinês é trabalho, trabalho,
trabalho. Nada além, no fundo é como dizia são Paulo, quem não trabalha, que
não coma. Não têm favelas, não têm drogas, os jovens não têm droga. Existe como
que uma consciência nacional positiva”. Pequim “está defendendo a dignidade da
pessoa, seguindo más que outros países a encíclica de Francisco ‘Laudato sì’”.
Para ficar completo o servilismo, não poderia faltar o
ataque aos Estados Unidos: “A economia não domina a política, como acontece nos
Estados Unidos. Como é possível que as multinacionais do petróleo manipulem o
Trump? O pensamento liberal liquidou o conceito de bem comum. Em sentido
contrário, os chineses propõem trabalho e bem comum”.
Abaixo lembrarei pontos de doutrina. Antes, fatos.
Afirmei acima, repentinamente o Prelado resolveu falar. Em termos. Tais
declarações não devem ser vistas no mínimo apenas como cadência trágica de
covardias diante do tirano intimidador e prepotente. Além de eventuais consonâncias
ideológicas ▬ sempre presente entre o Progressismo e o Comunismo (são delas tristes
e frisantes exemplos frei Betto e o ex-frei Boff) ▬ essse rebaixamento
degradante deve ser analisado no contexto da presente aproximação entre o
Vaticano e o governo chinês.
As notícias a respeito das tratativas puseram em
choque os católicos e bispos fieis a Roma, hoje na clandestinidade (a chamada
Igreja subterrânea), preteridos por bispos e seguidores da Associação
Patriótica Católica Chinesa, organismo estatal fundado em 1957 pelo governo
para controlar os católicos do País (ela comanda a chamada Igreja oficial,
subserviente a Pequim). A mencionada Associação, segundo texto dela, procura
implementar “os princípios da independência e autonomia, autogestão e
administração democrática” na Igreja Católica da China. Resumido, é organização
fantoche do governo e do Partido Comunista. Alguns de seus membros nem se
declaram católicos.
Emissários da Santa Sé tentam subordinar a ação
pastoral de bispos leais a Roma aos bispos indicados por Pequi, subordinar a
Igreja subterrânea à Igreja dita patriótica; em uma palavra, são entregues os perseguidos
aos perseguidores. O cardeal dom Joseph Zen, arcebispo resignatário de Hong
Kong tomou a defesa dos bispos e dos católicos leais a Roma, abrindo crise
séria com a Santa Sé. Adverte o anterior cardeal de Hong Kong: “Nos últimos
dias, irmãos e irmãs vivendo na China continental foram informados que o
Vaticano está pronto para se render ao Partido Comunista da China”. Continua o
Purpurado: “Percebendo que os bispos ilegítimos e excomungados vão ser
legitimados e que os bispos legítimos serão obrigados a se demitir, é forçoso
que os bispos legítimos e clandestinos estejam preocupados com seu destino.
Quantas noites de sofrimento padres e leigos terão de passar pensando que,
curvados, terão de obedecer bispos agora ilegítimos e excomungados, amanhã
legitimados pela Santa Sé e apoiados pelo governo?” O cardeal dom Joseph Zen
informou ainda que o Papa Francisco o advertiu, não quer um “novo caso
Mindszenty”. O cardeal Mindszenty se opôs ao governo comunista húngaro e à
política de aproximação de Paulo VI com o governo comunista húngaro.
Outros fatos. Dom Sánchez Sorondo garantiu, os chineses
“não têm drogas, os jovens não têm droga”. Vai contrao que dizem os próprios chineses.
A Comissão Nacional de Controle de Narcóticos, órgão do governo comunista
chinês, em recente declaração oficial advertiu que o problema das drogas no
país está “se disseminando com grande velocidade”. E a organização Human Rights
Watch condena o “tratamento cruel, desumano e degradante” padecido pelos
viciados e traficantes nas prisões chinesas. Uma parte, e não pequena, é
fuzilada, outra é internada compulsoriamente em locais de reabilitação. A
China, que não fornece dados, apavorantes certamente, é tida como o que mais
fuzila condenados no mundo, milhares anualmente. Existência de favelas. Sonha
dom Marcelo: a China “não tem favelas”. Pergunta o padre Bernardo Cervellera, missionário do Instituto Pontifício de Missões
Exteriores (PIME) e diretor de AsiaNews. especialista em assuntos
chineses: “Nosso bispo tentou ir ao sul de Pequim? Ali o governo está fazendo
sem-tetos aos milhares, desalojando trabalhadores migrantes. Visitou a periferia
de Shangai? Visitou as periferias das grandes megalópoles chinesas?” Claro, nada
disso viu o apressado e louvaminheiro eclesiástico.
Agora, um ponto de doutrina. João XIII, na “Mater et
Magistra” define o bem comum como o conjunto das condições da vida social que
permite às pessoas, às famílias e aos grupos alcançarem de maneira mais fácil e
plena a própria perfeição. Fica claro, o bem comum facilita a busca da
perfeição nos mais variados campos. Começo pelo religioso. No caso, o bem comum
deve facilitar a “salus animarum”, a salvação das almas. As gravíssimas
advertências do cardeal-arcebispo resignatário de Hong Kong me dispensam de
comentar qualquer coisa a respeito. Falei em liberdade religiosa. Recordo agora
o ambiente favorável ao desenvolvimento das virtudes morais (alcançar mais
facilmente a própria perfeição, ensina João XXIII). O governo chinês as
favorece? Por exemplo, o fortalecimento da personalidade, com a consequente
ampliação do âmbito da autonomia, é favorecido por governo totalitários? Seria
um disparate afirmá-lo. Favorece o pleno desenvolvimento das famílias? E a
política, agora oficialmente supressa pelo desastre monumental que ocasionou,
de um filho por família? E a imposição dos abortos? Milhões e milhões de abortos
impostos a cada ano. Poderia lembrar, sem fim, pontos apavorantes.
Foi título do artigo: O Arcebispo esbofeteia
impiedosamente a verdade. Está bem, mas vou acrescentar um advérbio: O Arcebispo
esbofeteia impune e impiedosamente a verdade. Deixando mais claro: Na
subserviência escandalosa aos tiranos, o Arcebispo impune e impiedosamente o Arcebispo
esbofeteia a verdade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário