O
governo Dilma acabou
Péricles
Capanema
Tem muita
gente achando, melhor Dilma renunciar logo, simplifica para todo mundo. Um deles
chamou minha atenção, nunca esperava.
Um bate e
volta rapidinho. Certo tipo de líderes magnetizam o público. Gandhi, de Gaulle,
Kennedy, tão diferentes, foram magnetizadores. Daniel Cohn-Bendit, em seu
tempo, outro; simbolizou o maio francês. No Brasil, Vladimir Palmeira foi o principal
expoente das agitações de 1968. Impressionou até a Nelson Rodrigues, crítico
delas: “Não sei, ninguém pode saber, qual será o destino desse rapaz. Mas sei
que é esta coisa cada vez mais rara – um homem”. Vladimir partiu para o exílio,
retornou, virou dirigente petista, acabou moído pela máquina partidária. Em
2011, Delúbio Soares voltou festejado ao PT, Vladimir caiu fora denunciando a
conivência com a corrupção. Preservou a condição de liderança carismática,
ainda que en veilleuse e esmaecida pela
pátina do tempo. Tomei um susto: “Sou contra o governo Dilma, que deveria
renunciar, mas quem vai às ruas no domingo [15
de março] vai defender teses de direita, com as quais não concordo.” Por
que Vladimir reivindica Dilma fora do Planalto? Vai saber. Uma coisa, sei: para
o antigo líder estudantil, no leme ela prejudica mais a esquerda que se for
embora já.
Dilma no
governo é desgoverno certo; por baixo, mais três anos e tanto de bagunça na
gestão, carestia, desemprego, roubalheira solta, crescimento magrelinho, se tanto.
E a exasperação do público, já amazônica, pode fácil bater em confins de
momento improváveis. Saiu faz pouco uma pesquisa coordenada por gente da Universidade
Vanderbilt dos Estados Unidos, trabalho sério (LAPOP, sigla em inglês do estudo).
Constata que de 2012 a 2014 o número de brasileiros adultos favoráveis a um
golpe militar para acabar com a ladroagem subiu de 36,3% para 48,7%. E a
porcentagem de brasileiros que participaram de atos de protesto subiu de 4,68%
em 2012 para 7,64% em 2014. Em 2015, como estará? A irritação cresceu. Sabem
quem fez no Brasil a pesquisa para o pessoal da Vanderbilt? O Vox Populi, tido
como linha auxiliar do PT nas últimas eleições presidenciais; no caso, se
errou, foi pra menos. Brota a desconfiança de que a tinta é mais carregada. Essa
metade da população adulta, desesperada com o afogamento do Brasil, vê a
intervenção militar como última tábua de salvação contra os ratos magros. E nem
trato aqui dos que querem ver a presidente impichada,
porcentagem bem mais em cima.
A
exasperação demorada, de si, catalisa o movimento de opinião antipetista ainda em
parte estacionado na louvável defesa da cidadania, ética na política e
transparência. Com o rolar do tempo, em cenário bem possível, tal opinião,
nutrida a contrapelo pelo descalabro dos governos da cumpanherada, tenderá a criar raízes mais fundas, caminhará para se
cristalizar em oposição doutrinária ampla; de outro jeito, se transmudará em corrente
de pensamento inimiga do totalitarismo, do coletivismo, do estatismo, favorecendo
responsabilidade pessoal, privatizações, prevalência da sociedade sobre o
Estado, e tanta coisa mais. É um risco tremendo para a revolução socialista no
Brasil, meta obstinada do que o PT tem de mais ativo e virulento.
Proportione servata, já aconteceu situação similar, veio depois
da Revolução Francesa. Por anos, a selvageria carniceira e a demolição social (parecia,
o inferno tinha aberto a bocarra) traumatizaram setores enormes do público
gaulês, antes superficiais e otimistas, que em reação de autodefesa acabaram
migrando para posições conservadoras, direitistas, tradicionalistas e até
contrarrevolucionárias, enraizando-se ali, formando mesmo blocos sociais de
resistência. Posições e pensamento. O distanciamento da esquerda marcou fundo o
século 19, ecoou no 20; até mesmo o triunfo dos setores ultramontanos no
Concílio Vaticano I pode ser validamente ligado a ele. Compensou para a
revolução agredir boçalmente na França os costumes, mentalidade e opinião da
gente direita para tentar impor na marra seu programa?
Temos fresquinho sintoma de que o
sentimento antipetista está enraizando. Dirigentes importantes do partido, Lula,
Tarso Genro, tantos outros, estão propondo a criação da Frente Ampla, envolvendo
partidos, sindicatos, ONGs e movimentos sociais, inspirados em parte no exemplo
uruguaio. Com isso, tiram do PT o protagonismo evidente, disfarçam do eleitor, colado
o nome fantasia, a sigla odiada. Com o passa-moleque, esperam oxigenar as agora
mirradas possibilidades de vencer no voto.
Vozeia o hierofante
das agitações de 1968: Dilma precisa ir embora, renunciar já. A esquerda com
vergonha na cara, constrangida, baixa os olhos. Você, o que acha?
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