Brisa de bom senso
Péricles
Capanema
A
entrevista de Luiz Antônio Nabhan Garcia, secretário de Assuntos Fundiários do
ministério da Agricultura, concedida ao Estadão (4.8.2019), é brisa de bom
senso, ventinho bom em região que padecia calmaria asfixiante e onde faz enorme
falta a ventania da sensatez.
Com
efeito, em profundidade no setor da reforma agrária ▬ falo dele e dói dizê-lo ▬
tudo continua igual como nos governos FHC, Lula, Dilma e Temer. A legislação permanece
a mesma e, sintoma pressagioso, não se percebe nenhum movimento para mudá-la
num sentido que favoreça a segurança jurídica, prosperidade no campo, salários
e renda melhores para quem vive da terra. Enfim, leis que promovam a dignidade
humana, obrigação dos homens de bem, a mais de preceito constitucional. Seria o
mais decisivo, fincaria proteção para agora e compraria seguro para as gerações
futuras. No caso, nada mais social, solidário e favorecedor dos pobres.
É sabido,
Salvador Allende comunistizou o campo e a cidade com o marco legal lá existente
(los resquicios legales), não precisou de instrumental novo. Igual pode
acontecer com o Brasil, precipitando-nos na rota de Cuba e da Venezuela, o
caminho da servidão, o que seria o inferno dos pobres, com presenciamos de
momento especialmente em Roraima. E estamos em momento propício para dinamitar tal
estrada.
Adiante. Infelizmente
o aparelhamento do INCRA subsiste em boa medida. Permanece dando as cartas parte
dos chamados técnicos que, muitas vezes em altos cargos de confiança, colaboraram
em governos anteriores para a destruição do campo mediante a aplicação manipulada
da legislação de redação malandra (aliás facilmente manipulável), relativa à reforma
agrária; por exemplo, na feitura dos índices e na avaliação do valor da
propriedade. E, nesse quadro, prosseguem indicações políticas para as
superintendências do INCRA nos Estados. Em suma, como antes, o futuro agrícola
do Brasil continua ameaçado.
Vamos à
entrevista do secretário de Assuntos Fundiários. O mais alvissareiro ali é o
anúncio de mutirão para fechar acordos com proprietários espoliados que lutam anos
a fio no Judiciário contra o verdadeiro confisco (ou esbulho, se quisermos) que
sofreram ▬ promessa por enquanto, para ser cumprida até dezembro. É reparação
de injustiças e destinação de áreas consideráveis, antes sujeitas à, por baixo,
bagunça do INCRA e do MST, focos habituais de toda sorte de malfeitos, que
passarão a ser utilizadas na produção agrícola moderna. Nabhan observa: “Não
tem dinheiro. Não é para beneficiar produtor, pelo contrário. Aquele depósito
feito há 10, 15 anos volta aos cofres públicos”.
Tem razão.
De fato, o INCRA em conluio com o MST (CPT também) via de regra implanta Brasil
afora o desatino dos assentamentos e num sem-número de casos fica depositado o
valor relativo às benfeitorias, enquanto se arrastam os processos. O restante
da indenização (ou, pelo menos, grande parte dela) será pago futuramente, na
conclusão do processo, em títulos da dívida agrária, com forte deságio no
mercado. O proprietário quer é a terra de volta, devolverá aliviado o valor que
está dormindo em depósito bancário.
De
passagem, noto na declaração do secretário, talvez inadvertidamente, a
influência do bafo antipático ao proprietário rural, em larga proporção soprado
pelos grandes meios de divulgação e sintoma aziago do ambiente intoxicado
contra o produtor do campo (latifundiário, ocioso, explorador de mão de obra
barata, inimigo do meio ambiente, vai por aí afora). Nem o presidente
licenciado da UDR a ele ficou imune: “não é para beneficiar o proprietário,
pelo contrário”. Devagar, é sim para beneficiar o proprietário injustiçado, a
medida vai ajudar em primeiro lugar o produtor rural, e é coisa ótima, para
celebrar como marco de política social (reflexos benéficos no bem comum). Merece
foguetório. Sentimos ainda o mesmo mau hálito em outro trecho da entrevista: “Se
tiver algum proprietário que diga ‘votei no Bolsonaro’ se o terreno está
improdutivo, vai ser desapropriado”. Epa! Escutei direito? Proprietário desapropriado?
Com exploração abaixo dos índices oficiais, cravados por funcionários do INCRA?
O sensato
para um líder rural seria trabalhar para modificar a presente legislação,
celebrada pela esquerda, na qual deposita grandes e fundadas esperanças, que
permite expropriação de fazendas com base em índices de utilização facilmente manipuláveis
e falsificáveis ▬ e que foram continuamente manipulados ao longo dos últimos
governos. E em pagas (só na promessa em geral) com base em avaliações
largamente arbitrárias. Infelizmente, temos aqui, repito, talvez
inadvertidamente, endosso a diplomas legais que são punhais desembainhados nas
costas dos produtores rurais.
Estamos
esquecidos que podem existir justificadas razões de mercado para deixar uma
propriedade ociosa? Entre outros motivos, superprodução e crise internacional.
Estamos esquecidos que compreensíveis motivos familiares podem determinar a
interrupção de uma exploração por alguns anos? No Brasil, no campo, a
ociosidade não prejudica o bem comum, em certos casos pode até favorecê-lo. E
há saída clara para distribuição de lotes a gente que de fato queira plantar, o
Brasil tem terras públicas, existem proprietários que venderiam a preços de
mercado suas terras ao governo em negociações livres.
Tem mais e não custa lembrar. Se não fosse o
disparate da reforma agrária, que infelicita o Brasil desde a década de 60,
hoje teríamos mais produção, maior produtividade, salários melhores no campo.
Inexistiriam essas milhares de favelas rurais em 88 milhões de hectares. E o
Brasil não teria jogado fora bilhões e bilhões de reais, favorecendo
roubalheiras, perseguições, crimes de vida, comércio de drogas, inibição de
investimentos; no melhor dos casos, péssima aplicação de dinheiro público. A reforma
agrária foi e está sendo uma desgraça para o pobre, para a agricultura e para o
Brasil. É um tumor de estimação instalado nas entranhas da Pátria. O sensato
seria extirpá-lo, óbvio ululante. Observei em artigo recente: “R$300 bilhões de
terras na bagunça. Coloque os empréstimos não devolvidos, os perdões de
dívidas, a assistência técnica estatal para aproveitadores, o controle tirânico
dos assentamentos pelos agentes do MST, a venda ilegal de madeira. Os
escândalos do mensalão e do petrolão são fichinha perto do escândalo do
programa da reforma agrária. Mas, é claro, não se pode extinguir o programa. Razão
técnica? Nenhuma. Não aumenta a produtividade. Razão social? Nenhuma. Piora a
situação dos pobres. Razão de paz social? Nenhuma. Tensiona a região em que se
implantam os assentamentos. Mas trona e sobrepassa tudo uma razão inamovível. É
tumor de estimação. Tumores de estimação são intocáveis”. (“A anemia do abril vermelho, postado em 19
de abril em periclescapanema.blogspot.com, em que estão argumentos que por
falta de espaço deixo de alinhar aqui; a respeito, ver ainda no mesmo blogue “O
INCRA precisa mudar de nome” e “Artigo sem título”)
Termino. Louvável
e refrescante brisa de bom senso, autorizando esperanças, a promessa do mutirão
dos acordos com proprietários espoliados. O Brasil que presta ainda espera que
a brisa se transforme em forte ventania da sensatez.
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