Caos no Judiciário faz
órfão o Brasil
Péricles Capanema
Os episódios patéticos ▬ melhorando, prenunciativos ▬
do domingo 8 de julho protagonizados pelo desembargador Rogério Favreto aumentaram
o alerta no Brasil que presta.
Em autêntica conduta bolivariana, esbofeteando
legislação e regulamentos das cortes, a tentativa brutal de soltar Lula escancarou
ferida na estrutura do poder no Brasil ▬ nos três, de forma particular no
Judiciário. Episódio sintomático, exibe ensaio de imprimir rumo estável a
qualquer custo. Todos viram, o writ foi acolhido sofregamente por magistrado ativista,
encardido militante petista, filiado ao PT entre 1991 e 2010; em 2011 escolhido
por Dilma Rousseff no quinto constitucional para assumir seu posto. A situação
caótica no Poder Judiciário vem sendo estimulada há tempos; não é de hoje o mau
exemplo despenca impune do alto.
Onde vale menos de um tostão furado o respeito à lei, onde
o Judiciário é concebido, à maneira dos países comunistas (e agora na
Venezuela) como instrumento da revolução, o que pode esperar o povo? Está
órfão, cada vez mais entregue à sanha dos tiranos do Judiciário. Órfão é o que,
na falta de forças próprias, fica sem proteção, inseguro, sem rumo, exposto ao
pior. Nossa situação.
Indefesos, agridem-nos
manifestações de prepotência e deboche de figuras representativas do Judiciário.
O mais grave, é comum serem provenientes de magistrados do Supremo, dando as
costas para exemplos de comedimento e retidão de caráter, aos quais seria
normal emular, deixados por Epitácio Pessoa, Nelson Hungria e tantos outros. É
claro, desaferrolham a rota para o caos. A turma demolidora desembesta “tinindo
nos cascos” (no caso específico, era a promessa do ministro Lewandowski na sua intenção
bastarda de proteger o ex-ministro José Dirceu). No trajeto, a farândola da
devastação acavala vilanias contra adversários, evidenciando ao povo
traumatizado em quem mãos foram colocados os instrumentos que o dirigirão.
Também como exemplo, só lembro (nem dá para transcrever, mas estão na web,
11.8.2012) o efeito vitriólico das ponderações sensatas do jornalista Ricardo
Noblat sobre o ânimo do antigo subordinado de José Dirceu, próximo presidente
do STF, ministro José Dias Tóffoli. Uma amostra do monturo jogado na face dos
brasileiros: “O Zé Dirceu escreve no blog dele. Pois outro dia, esse canalha o
criticou. Não gostei de tê-lo encontrado aqui. Não gostei. Chupa. Minha p. é
doce. Ele que chupe minha p.” Estão em patamar parecido manifestações debochadas
de Gilmar Mendes e arroubos de irresponsabilidade faceira do ministro Marco
Aurélio Mello. E ainda de outros ministros, quando fazem tábula rasa das
disposições constitucionais sobre o casamento e o respeito à vida. A respeito,
o ministro Luiz Fux foi de clareza solar: “Essas questões todas deveriam,
realmente, ser resolvidas pelo Parlamento. Mas acontece uma questão muito
singular. O Parlamento não quer pagar o preço social de decidir sobre o aborto,
sobre a união homoafetiva e sobre outras questões que nos faltam capacidade
institucional. Como eles (parlamentares) não querem pagar o preço social e como
nós não somos eleitos, nós temos talvez um grau de independência maior porque
não devemos satisfação depois da investidura a absolutamente mais ninguém”. Com
preço social quis dizer, temor de não serem reeleitos, porque o eleitor é
conservador. Então, atropela-se a vontade popular via Judiciário, para impor a
agenda de setores libertários encarapitados em posições de relevância. Em
sintonia com Luiz Fux, Luís Roberto Barroso tem preocupante teoria “iluminista”
de rejeição da vontade popular, quando conservadora: “O papel iluminista deve ser exercido em conjunturas nas quais é preciso
empurrar a história. Em alguns momentos cruciais do processo civilizatório, a
razão humanista precisa impor-se sobre o senso comum majoritário.” Senso comum
majoritário é disfarce para a vontade majoritária da população. Se for
conservadora, pontapé nela, disfarçado pela linguagem culta e educada. Tais
opiniões obscurantistas, contraditórias com o dogma democrático da soberania
popular, de fato, iluminam muito o quadro geral. Outra orfandade.
Há diferentes formas de se sentir órfão. Uma delas, talvez a mais
pungente, o pai, mesmo
presente, faz o filho se sentir órfão, quando apunhala sua função natural de “role
model”. Pais em relação a filhos, dirigentes em qualquer esfera frente a
subordinados.
Volto ao juiz
Favreto. Os efeitos imediatos do ativismo do dr. Renato Favreto foram contidos
na nascente pela reação pronta de quatro outros juízes: Sérgio Moro, Gebran
Neto, Thompson Flores e Laurita Vaz. Está se vendo, graças a Deus a
contaminação não atingiu o corpo inteiro.
A ministra
Laurita Vaz, presidente do STJ, foi mais contundente e clara. Transcrevo
trechos de sua decisão ao negar provimento ao habeas corpus impetrado pelo
advogado Sidney Duran Gonçalez. De início, a juíza manifesta perplexidade pelo
pedido de habeas corpus: “Depois de percorrer todas as instâncias do Poder
Judiciário Brasileiro, a questão foi ressuscitada por advogados que peticionaram
estranhamente perante determinado Juízo de Plantão”. Importa notar o
estranhamente e o determinado. Insinuam contubérnio, conchavos de bastidor.
O
desembargador Fraveto esteou a argumentação no “fato novo” de Lula ser
pré-candidato à Presidência. Seus direitos estariam sendo coarctados, quebrando
a igualdade e isonomia, determinadas pela Constituição, entre todos os
pré-candidatos. A ministra refuta a arteira alegação e destaca a agressão à
ordem jurídica representada pela decisão do desembargador Fraveto: “inusitada e
teratológica decisão que, em flagrante desrespeito à decisão colegiada da 8ª
Turma do TRF da 4ª Região, ratificada pela 5ª Turma do STJ e pelo Plenário do
STF, erigiu um “fato novo” que, além de nada trazer de novo ▬ pois a condição de
‘pré-candidato’ é pública e notória há tempos ▬, sequer se constituiria em fato
jurídico relevante para autorizar a reapreciação da ordem de prisão sob
análise”. Continua: “Causa perplexidade e intolerável insegurança jurídica
decisão tomada de inopino, por autoridade manifestamente incompetente, em
situação precária de plantão, por meio de insustentável premissa. Diante dessa
esdrúxula situação processual, coube ao Juízo Federal de primeira instância,
com oportuna precaução, consultar o Presidente de seu Tribunal”. Fala ainda a
ministra, “tumulto processual sem precedentes na história do direito
brasileiro”.
Não tem precedentes, mas é prenunciativo. O Judiciário
está incrustado de fravetos, contaminado, com maus exemplos desbarrancando do
alto. Tal poder é municiado por egressos de universidades lotadas de
professores fravetos. Processo enraizado, difícil de ser interrompido. E assim
temos infecção, mortífera se não combatida, para muitos anos, décadas,
provavelmente. O vírus em sua mutação atual: o bolivarianismo, xodó do PT,
cultivado em caldos de cultura Brasil afora, até em sacristias e seminários. Mais
um sintoma de nossa trágica orfandade de setores diretivos (elites nos mais
variados campos) que possam encaminhar o Brasil rumo a um futuro de grandeza
cristã.
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