Péricles Capanema
Em 17 de abril mediante
documento intitulado “Mensagem da 26ª Assembleia Geral da CNBB ao povo
brasileiro”, a entidade tomou posição sobre as próximas eleições. Durante a
leitura tive uma surpresa e me veio à mente, nem sei por que, título de artigo
do prof. Plinio Corrêa de Oliveira, publicado em “Catolicismo”, abril de 1964:
“Pensando, criticando, matizando, e esperando na borrasca do século 20”. Sempre
gostei da frase, reflete postura séria e proveitosa do espírito; diante de
qualquer assunto, refletir, analisar, confrontar. E só então agir.
É o que pretendo
fazer com o importante documento da entidade que congrega os bispos do Brasil. No
geral, uma borrasca, mas há uma fresta de luz no meio. Verão abaixo o motivo da
surpresa.
No seu primeiro ponto
o documento episcopal traz forte condenação do aborto; de outra forma é advertência
contra candidatos que o propugnem: “[Bispos católicos do Brasil] preocupados
com a defesa integral da vida”. Não é novo, a CNBB sempre se manifestou louvavelmente
contra o aborto provocado e demais medidas que são assassinas ou favorecem o
assassinato.
O texto coloca ênfase
na construção do bem comum. Cinco vezes ali aparece a expressão. Em si, normal,
até imprescindível em documento dessa índole. Infelizmente, em muitas das
posições abaixo analisadas, ele foi desconsiderado, para dizer o mínimo. Assim
o definiu João XXIII na “Mater et Magistra”: “o
conjunto das condições sociais que permitem e favorecem nos homens o
desenvolvimento integral da personalidade”. Simples e denso.
O
desenvolvimento inteiro da personalidade, objetivo do bem comum (e do Estado)
se faz bafejando liberdades naturais cujo desabrocho enérgico é o único fator
que pode efetivamente gerar uma sociedade protetora dos direitos humanos, dessa
forma harmonicamente desigual. Se quisermos, proporcionadamente desigual. Neste
contexto, o aumento das desigualdades em todos os âmbitos da vida é bem a ser desejado.
E se torna claramente contrária ao bem comum a sociedade igualitária. Com
harmonia, proporção, razoabilidade, quanto mais desiguais os homens, nos mais
diferentes domínios, mais rica de valores e bens será a sociedade, e assim mais
perfeitos e felizes seus componentes. A CNBB aqui, fiel a seu longo passado de
subserviência ardente ao ideário petista, propugna como objetivo “a construção
de um país justo, ético e igualitário”. Justo e ético, no caso quase uma
redundância, está bem. Igualitário? Os bispos se esqueceram de nomear como
objetivo ▬ num país outrora intitulado de Terra da Santa Cruz ▬, que seja
verdadeiramente cristão, fiel às suas origens.
Ainda
a deplorável contumácia na posição da companheira de viagem do petismo, cujos
setores decisivos sempre foram furibundamente favoráveis ao aborto e a medidas
contrárias à família, agora especialmente a ideologia de gênero: “A carência de
políticas públicas consistentes no país está na raiz de graves questões
sociais, como o aumento do desemprego e da violência”. Todos sabem, é o que
afirma falaciosamente o PT e assemelhados. O aumento do desemprego tem raiz,
mais proximamente, no intervencionismo estatal amalucado do governo Dilma
Rousseff, que afundou o Brasil. Mais longinquamente, em boa medida na opressão
coletivista que impede o desabrochar da liberdade natural de empreender,
protegida pela garantia ao direito de propriedade e à livre iniciativa.
Houvesse mais respeito ao princípio de subsidiariedade, menores seriam o
desemprego e menos agressiva a violência.
Continua
o documento na trilha esquerdista: “A perda de direitos e de conquistas
sociais, resultado de uma economia que submete a política aos interesses do
mercado, tem aumentado o número de pobres”. Nem vou comentar. Os Estados
Unidos, despreocupados com as tais conquistas sociais, é o paraíso terreno sonhado
pelos pobres de países, verdadeiros infernos sociais, lotados das tais
conquistas, como Cuba, Venezuela, Nicarágua. É triste, mas a CNBB, queira ou
não, trabalha para que o Brasil tenha destino semelhante a eles. De passagem,
conquista social, expressão enganosa, virou mantra político. Serve para tudo,
significa nada de sério.
Agora,
a surpresa. Para as eleições, a CNBB defende fazer valer “a Lei 135/2010,
conhecida como ‘Lei da Ficha Limpa’, que torna inelegível quem tenha sido
condenado em decisão proferida por órgão colegiado”. Lula virou ficha-suja. A
CNBB aqui advoga claramente medida que o coloca fora das próximas eleições. Sabia
que estava fazendo uma trombada na agitação petista. Pelo histórico deprimente,
sempre alinhada com as últimas demagogias esquerdistas, não era de esperar. Já
é alguma coisa, um golinho d’água para quem está sedento.
Convém
notar que a atitude acima vai na linha do que dias atrás mandou divulgar dom
Odilo Scherer sobre a pantomina (oficialmente, ato ecumênico) pró-petista de
dom Angélico Sândalo Bernardino em frente do Sindicato dos Metalúrgicos em São
Bernardo do Campo: “Sobre o ato religioso realizado ontem na frente do
Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, a assessoria de imprensa da Arquidiocese de
São Paulo esclarece que: 1. Não se tratou de Missa, mas de um ato ecumênico; 2.
Foi iniciativa pessoal de quem promoveu o ato; 3. Não houve participação da
CNBB nem da arquidiocese de São Paulo; 4. O ato aconteceu fora da jurisdição e
responsabilidade do arcebispo e da arquidiocese de São Paulo; O arcebispo de
São Paulo lamenta a instrumentalização política do ato religioso”.
Aliás, não é a primeira vez que dom
Odilo Scherer sai publicamente contra setores extremados episcopais, ligados à
CNBB. Em 22 de junho de 2017, a CNBB defendeu o CIMI, de orientação muito
conhecida, em disputa que aqui não vou relatar (está relatada no meu artigo ‘A
CNBB, mais uma vez, agrava a exclusão social’, 25.6.2017). Dizia o documento da
entidade episcopal: “Tenha-se em conta ainda que as proposições da
CPI se inserem no mesmo contexto de reformas propostas pelo governo,
especialmente as trabalhista e previdenciária, privilegiando o capital em
detrimento dos avanços sociais. Tais mudanças apontam para o caminho da
exclusão social”. Na ocasião, o cardeal-arcebispo de São Paulo de público
deixou ver o desacordo com a CNBB: “Penso que de toda maneira há
necessidade de reformas tanto na lei trabalhista como na lei da Previdência.
Sim, acho que é necessário fazê-las e fazê-las bem”. Parece, o Purpurado
não está só entre seus pares.
Concluo. Exausto de
esperar, qual lamparina com paviozinho bruxuleante na borrasca, como católico
filho espiritual do Episcopado, ainda tento entrever uma migração célere ▬ cada
vez menos provável ▬ rumo a posições como as cardeal Jószef Mindzenty, antigo Primaz
da Hungria. Rezo para que aconteçam;
entrementes, sigo o que julgo dever, de forma matizada expressar com respeito desvios
demolidores.
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