quinta-feira, 23 de agosto de 2018

O caminho da grandeza



O caminho da grandeza

Péricles Capanema

Para sua vida cada um ambiciona, incansavelmente, uma nota de grandeza. Sempre cobiça alguma coisa que a eleve, que seja por instantes, da mediania na qual patina para patamar de excelência. Memoráveis, a atitude ou conduta seriam como cerejas em bolo insosso. Tantas vezes aconteceu, um simples ato de heroísmo ou de abnegação foi celebrado por familiares do autor por décadas a fio. A vida fica então mais elevada, fulgurante, justificada.

Se possível, todos desejam muito mais, óbvio, almejam a vida mergulhada na grandeza. Quando despretensioso tem grande potencial, é ideal nobre e civilizatório, embebido do impulso de perfeição. Existem dele incontáveis formas, a grandeza moral, a política, a militar, artística, patrimonial, intelectual, familiar, tantas outras, enfim. São avanços na ladeira da perfeição, dificultam retrocessos sociais.

Tais reflexões flutuavam meio descosturadas, enquanto ouvia atento o Evangelho da missa de domingo 19 de agosto. Como luva na mão, o pensamento se encaixava no texto lido. São Lucas relata a visita de Nossa Senhora a santa Isabel, sua prima, casada com Zacarias, sacerdote do Templo de Jerusalém, posição de destaque na sociedade do tempo; ambas esperando um filho. Tratava de cinco personagens de expressão insuperável na história humana, em especial na história da salvação: Nosso Senhor, Nossa Senhora, são João Batista, santa Isabel, são Zacarias. E das atitudes de dois deles, Nossa Senhora e santa Isabel.

Nenhuma ostentação, nenhuma bazófia, total ausência de fanfarronice na conduta e nos diálogos. E nem poderia ser diferente, cenas a anos-luz do que estamos acostumados a presenciar da manhã à noite em nossa sociedade obcecadamente exibicionista. Ali pululavam lições de que a grandeza (a verdadeira) é irmã da humildade e ambas respiram veracidade.

Nossa Senhora, muito jovem ainda, foi assim recebida pela prima, anos mais velha, mulher em situação social de destaque: “A que devo a ventura de que a mãe de meu Senhor venha ter comigo?” Enuncia a razão: “Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre”. Santa Isabel, reverente, reconhecia alegre, não estava à altura de receber e ter a prima em casa. Modelo de conduta para quem aspira à grandeza, o primeiro passo sempre é reconhecê-la alegre e reverente quando em outro a percebe, não importa o campo.

A história do mundo toma rumo novo por tal manifestação de humildade, expressa em frase leve de pessoa educada, respondida por outra lição de modéstia, que também atravessou os séculos. Maria cantou o Magnificat iniciando-o no mesmo tom: “A minha alma engrandece o Senhor; e meu espírito exulta em Deus meu Salvador. Porque pôs os olhos na baixeza de sua serva”. Ali estava uma escrava.

A seguir, palavras que nenhum homem pode repetir, senão como prece: “De agora em diante todas as gerações me chamarão bem-aventurada”. Em cada uma das gerações, até o fim do mundo, a partir do louvor de santa Isabel ▬ nesse sentido a primeira devota pública de Nossa Senhora ▬, ecoa e ecoará a glorificação prenunciada no Magnificat. Diante disso, o que é a grandeza de um césar, no meio de aclamações, entrando vitorioso em Roma? Poeira suja.

Maria, como hóspede, despretensiosa, por três meses ficou na casa de Isabel, anfitriã, ajudando-a. Depois voltou para a sua. Como disse, cinco pessoas conviviam ali, Nossa Senhora, santa Isabel e são Zacarias. Falavam de duas outras, que ainda não tinham visto a luz do dia: Nosso Senhor e são João Batista. Aquele encontro poderia ser intitulado a estadia das preparações.

Pela presença, atitude e palavra a Mãe de Deus moldou o ambiente em que viveria o Preparador do caminho para seu Filho. São João Batista tinha por missão preparar caminhos. “preparai o caminho do Senhor” (Is., 40,3). E o profeta Malaquias disse dele, haveria de preparar “o caminho diante” de Cristo. É a voz que clama no deserto: “Preparai o caminho do Senhor” (Is. 40:3). Sua missão, nas palavras de são Lucas, era “habilitar par o Senhor um povo preparado”.

João Batista seguiu o exemplo da mãe, reconheceu sempre seu lugar de preparador, precursor: “Eu não sou o Cristo” (Jo., 1, 20). E quando viu Cristo de longe, apontou-o para que seus discípulos o deixassem e seguissem ao Mestre divino: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo, 1, 29). “Estava João outra vez na companhia de dois dos seus discípulos e, vendo Jesus passar, disse: Eis o Cordeiro de Deus! Os dois discípulos, ouvindo-o dizer isto, seguiram Jesus” (Jo, 1, 35-37). Que ficasse sem discípulos, pouco lhe importava, só desejava preparar as vias para Quem anunciava.

Continuo falando em grandezas naturais e sobrenaturais. Faltam palavras para qualificar são João Batista, apontado por Jesus Cristo como o maior homem que até então existira: “Que fostes ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento? Mas, que fostes ver? Um homem vestido de roupas finas? Mas os que vestem roupas finas vivem nos palácios dos reis. Então, que fostes ver? Um profeta? Eu vos afirmo que sim, e ainda mais do que profeta. É dele que está escrito: eis que envio o meu mensageiro à tua frente; ele preparará o teu caminho diante de ti. Entre os nascidos de mulher, não apareceu nenhum maior do que João, o Batista” (Mt, 11,8- 11).

Acabou minha labuta. Matutava em formas várias da grandeza, a leitura do Evangelho atraiu minha atenção para textos bíblicos a ela relativos, dali retirei extratos, neles cintilam condições para caminhar até ela. Achei útil compartilhar o trajeto com leitores. É caminho também para a perfeição, qualquer delas, até contêm conselhos para a santidade. Lições para cada um de nós.

sábado, 11 de agosto de 2018

O bom exemplo colombiano


O bom exemplo colombiano

Péricles Capanema

A América Latina, por obra sem graça de seus movimentos de esquerda, continua objeto da troça no mundo mais civilizado e especialmente da gente direita. Agora vamos a exemplo inaudito que se arrasta anos afora. Existe por aqui (excluo no caso a América Central e o México) um disparate [verdadeiro negotium perambulans in tenebris] chamado União das Nações Sul-americanas ▬ Unasul. Guarde o nome, Unasul, pode ser que deixe de existir daqui a pouco, não tem nenhuma importância.

Ninguém se preocupa com a joça (nem a esquerda, quando não encena para a galeria). A palermice tem sede em Quito, parlamento em Cochabamba e o presidente atual é o Evo Morales. Só faz bem duas coisas: torra dinheiro e dá vexame. A propósito, a cota brasileira para a geringonça é de 4 milhões de dólares anuais, há três anos não paga. Pagar e pendurar dá na mesma.

Vou apresentá-la melhor. Da Unasul participam, ou participavam, doze países; ia dizendo doze patetas: Argentina, Uruguai, Paraguai, Bolívia, Equador, Peru, Chile, Suriname, Guiana, Venezuela, Colômbia e Brasil (para vergonha nossa). Já existia desde 2004 uma altissonante Comunidade Sul-americana de Nações, da qual brotou em 2008, gestada por hierofantes da política, à frente dos quais Hugo Chávez. Entre outros, Lula, Nestor Kirchner (depois a mulher), Evo Morales, Rafael Correa, Tabaré Vásquez (depois José Mujica), Michelle Bachelet. Lustroso plantel, embora de padrão terceiro-mundista. O bruxo-mor da estrovenga sempre foi o coronel Hugo Chávez. O grande objetivo, fazer frente à influência norte-americana na região. Em agosto de 2009, esbravejava Chávez: “Chegou a hora da América do Sul, a hora da Unasul, confiamos na capacidade política de nossa nascente união para enfrentar agora essa ameaça [a influência dos Estados Unidos] que compromete o futuro de nossas repúblicas, o futuro de nossos povos e o futuro de toda a humanidade”. O futuro da Venezuela, bem entendido, não estava comprometido pelos delírios bolivarianos. Nos últimos anos, 2,2 milhões de venezuelanos deixaram o país, fugindo da fome e da ditadura, buscando futuro em outras regiões não flageladas pelo bolivarianismo.

A propósito, é óbvio, os Estados Unidos estão morrendo de medo da Unasul, os políticos em Washington nem conseguem dormir só de pensar que na América do Sul atua tal organização.

Em abril passado, Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Paraguai e Peru finalmente anunciaram que deixariam de participar da Unasul. Não dava mais seguir fingindo que a tal estrutura não é um disparate dos pés à cabeça. Iam se reunir, formar comissões, emitir comunicados, coisas assim, tomar atitudes. Já estamos em agosto e quase nada.

A Colômbia forçou os acontecimentos, deixou a lenga-lenga, deu o bom exemplo de como as coisas devem ser feitas. Em resumo, apressou o passo, comunicou aos demais e lerdos participantes da maluqueira chavista: “Estou fora”.

Mergulhemos nos fatos recentes. Ivan Duque, o novo presidente colombiano, havia prometido durante a campanha tirar a Colômbia desse ambiente tóxico. Preto no branco, não admitia mais seu país “cúmplice da ditadura venezuelana”. Explicou: “Sou a favor de que a Colômbia se retire da Unasul, não podemos pertencer a uma organização que foi criada por Chávez para legitimar o seu regime e foi uma grande promotora, por seu silencio, de uma ditadura. Parte da tragédia que se vive na Venezuela se deve à grande indiferença dos países latino-americanos”.

Com três dias no cargo de mandatário supremo da Colômbia cumpriu a promessa. Na sexta-feira, 10 de agosto, Carlos Holmes Trujillo, ministro das Relações Exteriores, anunciou que a Colômbia estava abandonando a Unasul. “É uma decisão política irreversível”. Acabou. O ministro convidou os outros países a se unir a este avanço no rumo da liberdade, da decência e da respeitabilidade. “Estamos em um processo de consultas com outros países que, aparentemente, desejam tomar o mesmo rumo. Se for consolidada decisão similar, atuaremos em conjunto”.
Se não for, paciência. A Colômbia tomará sozinha a atitude. Grande avanço. Pelo menos um país da América do Sul deixa de fazer papelão feio diante do mundo. Nem todos entre nós escolheram a apatia no pântano do retrocesso.

quarta-feira, 8 de agosto de 2018

Os drones que podem nos atacar


Os drones que podem nos atacar

Péricles Capanema

Até agora ninguém informou direito o que aconteceu no sábado com Nicolás Maduro enquanto presidia a comemoração dos 81 anos da Guarda Nacional. O mandatário grita que foi atentado a partir de drones. Contudo, nenhum dos onze jornalistas presentes à cerimônia viu os tais drones. Uns garantem, houve incêndio em apartamento próximo ao desfile. Outros, explodiu botijão de gás dentro de um apartamento. Katherine Pita, moradora de prédio chegado ao local do desfile, nega a tal explosão do botijão. Afirmou: “Apenas um drone caseiro que se chocou contra o edifício e explodiu”. Parece que era um dos drones que filmava o desfile. Luís Salamanca, cientista político venezuelano, afiança que “ninguém sabe exatamente” o que aconteceu “nem mesmo o governo”.

Nicolás Maduro aproveitou-se do insólito do caso e pulou para a frente da cena. Esgoelou que foi atentado terrorista para matá-lo com participação dos Estados Unidos, Colômbia e ultradireita venezuelana. “O nome de Juan Manoel Santos está atrás do atentado”, denunciou enfurecido. Começou a prender adversários.

Claro, Estados Unidos e Colômbia negaram participação na farsa. Juan Manoel Santos era na ocasião o presidente da Colômbia (entregou o cargo dia 7, 3ª). Foi tão estapafúrdia a acusação que o ex-presidente preferiu levar na esportiva: “Santo Deus! No sábado estava fazendo coisa mais importante, o batismo de minha neta”. Lembrou a propósito uma desparafusada acusação já antiga de que trabalhava em união com os serviços secretos britânicos e concluiu: “Sempre achei que aquilo era o cúmulo da loucura, mas não, enganei-me; ontem vi uma outra ainda pior, que estou em conluio com a inteligência dos Estados Unidos e com a direita venezuelana, preparando complôs para assassinar o presidente da Venezuela. No meu cargo, a gente desenvolve um couro de crocodilo, depois vira couro de hipopótamo, precisa ter couro grosso”.

A oposição venezuelana assegura que tudo não passa de circo montado pelo governo bolivariano para desviar a atenção da gigantesca crise pela qual passa o país, culpa da dupla Chávez-Maduro e aumentar a repressão. Apenas como lembrança, a inflação dos dois últimos anos, segundo o FMI, foi de 1.800.000%; isso mesmo, um milhão e oitocentos mil por cento. Continua disparada.

Nenhum país sério deu ouvidos à pantomima montada em Caracas. Demagogos e revolucionários rasgaram as vestes. O mais importante, a Rússia de Vladimir Putin, de olho no petróleo da Venezuela e na possibilidade de agir na América Latina. “Condenamos energicamente uma tentativa de atentado contra o presidente da República Bolivariana da Venezuela, perpetrado no dia 4 de agosto, que provocou sete feridos”, foi a solidariedade do governo o russo.

Cuba andou na trilha de Vladimir Putin. “Este ato de terrorismo, que pretende desconhecer a vontade do povo venezuelano, constitui nova tentativa desesperada de conseguir pela via do magnicídio o que não conseguiram obter em múltiplas eleições”, consta da extensa nota divulgada pelo ministério das Relações Exteriores da ilha-cárcere.

Bolívia, no mesmo rumo: “Repudiamos energicamente uma nova agressão e covarde atentado contra o presidente Nicolás Maduro e o povo bolivariano. Depois do fracasso em seu intento de derrubá-lo democrática, econômica, política e militarmente, agora o império e seus servidores atentam contra sua vida. Esta tentativa de magnicídio, delito de lesa-humanidade, mostra o desespero de um império derrotado por um povo valente. Nossa solidariedade. Força irmão presidente Maduro e povo bolivariano!”, delirou Evo Morales.

Na mesma direção desembestaram Irã, Turquia, Síria, Nicarágua, todos, como se vê, modelos impolutos de respeito aos direitos humanos.

O movimento narcoterrorista FARCS (antes sigla de Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, de momento sigla de Força Alternativa Revolucionária do Comum que agora protesta pisar via pacífica, e não consegue credibilidade quando blasona distância do tráfico das drogas) fez defesa altissonante de Maduro: “Rechaçamos e condenamos este grotesco atentado pessoal. É a mais séria tentativa de assassinato de Nicolás Maduro”.

E no Brasil? Os aliados e amigos das FARCS, Cuba e assemelhados não poderiam deixar de aproveitar a ocasião de apoiar o bolivarianismo. O PT, por meio de sua Secretaria de Relações Internacionais, fez causa comum com a trupe acima: “Rechaçamos as pretensões de violência que buscam alterar as decisões democráticas do povo da Venezuela, atentam contra a paz na Venezuela e na região latino-americana e caribenha”.

Perfilou-se também o PC do B: “O chamado Grupo de Lima, do qual faz parte, do qual faz parte o ilegítimo governo brasileiro, transforma a Venezuela em alvo constante de agressões diplomáticas, das quais se alimenta a crise política interna e o recurso a métodos criminosos de oposição política”. Acrescenta “o mais firme repúdio ao atentado dirigido contra a vida do presidente da República Bolivariana da Venezuela".

Mais um exemplo, o do MST, por meio da demagogia usual do chefe, João Pedro Stédile: “As forças do capital no império dos Estados Unidos já assassinaram muitos líderes populares na América Latina ao longo do século XX. Daqui do Brasil, em nome do MST e de todos os movimentos populares reunidos na Frente Brasil Popular, manifestamos nossa indignação em relação ao atentado e nossa solidariedade ao presidente Maduro e ao povo venezuelano”.

Por que me detive em tantos exemplos? Por razão da maior importância, será essa a companhia do Brasil no cenário internacional, caso a esquerda vença as eleições. O País, vulnerado por tais drones, se alinhará rapidamente com o que há de pior.

A propósito, acima falei da trupe que expressou solidariedade a Maduro. Termino transcrevendo acepções de trupe, segundo o Dicionário Online de Português: “Corja, reunião de criminosos, grupo de pessoas que prejudicam outras, escumalha, escória, gentalha”. É só; que Deus nos proteja.

segunda-feira, 6 de agosto de 2018

O observador isolado



O observador isolado

Péricles Capanema

Vou falar das eleições, enveredando antes por um desvio ▬ só aparentemente. Não é de hoje, para tristeza nossa, o Brasil tem sociedade enormemente atrofiada, em especial se considerarmos até onde poderia ter chegado. Só um exemplo, pesquisa recente aponta que mais de 30% dos brasileiros são analfabetos funcionais, proporção que se mantém estável há 10 anos. Boa parte do restante não está distante daí, pois só 12% se comunicam adequadamente pela escrita. Imaginem o que essa chaga significa de exclusão social. Nem falo do Estado, ali existe atrofia, claro, porém o que choca de plano é a elefantíase. Paquidermes doentes têm membros e órgãos com movimentos atrofiados.

Estado de espírito preocupante, como nação estamos nos acostumando ao decaimento, poucos agora falam do Brasil como país do futuro, reflexões antes correntes, carregadas de tons esperançosos e até de ufanismo por vezes infantil. Exemplo tocante e ingênuo de tal propensão foi o livro do conde Afonso Celso “Por que me ufano de meu país”. Temos atenuante, as decepções repetidas corroeram crenças, as esperas dilatadas exauriram ânimos ▬ imaginem, o livro do simpático conde é de 1900.

Enfim, se o ufanismo louvaminheiro era ruim, nunca o foi a esperança. Não é o que de momento vemos, repito. O público parece aceitar resignado um presente cinza e a perspectiva de porvir inexpressivo. E ainda existe pessoal que brinca com a situação desoladora, destilando fel em comentários agridoces.

Não é consolação, mas tal apatia dissolvente alanceia ainda pessoas, famílias, regiões. Aos milhões; basta olhar ao redor de nós, gente acomodada, apática, em situações gritantemente inferiores a sua condição originária. O último imperador da China, Pu Yi (1908-1967) passou seus últimos anos como funcionário apagado da burocracia maoísta. Deixou escorrer os anos como jardineiro e bibliotecário. Comenta-se, vivia conformado, pior, satisfeitinho. Terrível exemplo de decadência e demolição de personalidade. Poderia ser jardineiro e bibliotecário, ocupações dignas, mas o olhar precisava estar imerso na grandeza que a Providência lhe destinara, esmigalhada pelos infortúnios. Para todos, para não afundar cada vez mais, a única reação decente é a inconformidade enérgica (quando possível, o exercício intenso, com norte, das potencialidades indolentes). Não vislumbro outro caminho para restauração, prosperidade e felicidade; pelo menos para manter para si e diante dos outros o respeito devido.

Não houve desvio, fiquei no trilho. Estamos em período eleitoral, o combate à atrofia deveria ser a prova dos nove, o teste do tornassol de todas propostas; de outro ponto de vista, o substrato dos debates.

Se a proposta nos ajudar a sair do poço da atrofia e escalar a montanha da plenitude, é aproveitável. Na educação, economia, privatização, reforma previdenciária, controle fiscal, segurança, saúde pública, ciência e tecnologia, enfim, em tudo, a simpatia deveria ir para candidatos cujos compromissos (e exemplo de vida) estimulem o desenvolvimento de potencialidades nos campos em que a administração pública tenha condições de influir. Soltar amarras, desburocratizar, diminuir impostos, aumentar as responsabilidades de cada um pelo seu próprio destino (condição de autonomia), limitar o poder do Estado e ampliar o âmbito de ação das forças sociais, destravariam nosso potencial. E nos forneceriam recursos para atender aos fracos e desvalidos.

Em suma, a busca da plenitude, perseguida com senso de proporção e animada pela justiça é caminho real para a inclusão social. Perto de nós temos exemplos dilacerantes de escolhas atrofiantes, Cuba e Venezuela no destaque, xodós da esquerda católica e do petismo, de cujos efeitos cruéis deveríamos fugir como da peste.

Nelson Rodrigues certa vez afirmou “aprendi a ser o máximo possível de mim mesmo”. Conhecimentos e hábitos podem nos levar ao máximo possível de nós mesmos. No conhecimento estão as percepções. Com auxílio de Deus, tantas vezes é possível entrever o que a Providência preparou pelo arranjo de qualidades pessoais e circunstâncias do meio para pessoas e grupos sociais. São vocações das mais variadas naturezas, lobrigadas por sintomas de difícil explicitação. Igual vale para o Brasil, o tema transcende campanhas eleitorais, sei bem, mas substancialmente é o grande assunto subjacente à algaravia da ocasião. Queiramos ou não, o substrato tudo em debate é a escolha plenitude versus atrofia.

Por que titulei o artigo de observador isolado? Poucos analisam assim, são hoje uns isolados. Contudo, vista desse belvedere, a paisagem é mais ampla e instrutiva. Meu convite cordial, observem também daqui o panorama.